A Assim Chamada Acumulação Primitiva

Resumos sobre um enfoque político do capítulo XXIV de O Capital, de Karl Marx – Política II: Teoria Política Contemporânea – Prof. Luiz Gustavo Groham

  • a estrutura econômica da sociedade feudal proveio da sociedade feudal, pois a decomposição desta liberou elementos para aquela.
  • a classe produtiva (antes escravos, servos) foi transformada ao longo do curso histórico em trabalhadores assalariados (proletariado) através da libertação dos regimes alienadores a terra e da coação corporativa. Os trabalhadores rurais (camponeses) foram, assim, expropriados da base fundiária.
  • a classe dominante (nobreza e mestres-artesãos corporativos principalmente) também teve de ser deslocada de sua acomodação inicial pelos capitalistas burgueses.
  • A Inglaterra apresenta a forma clássica dessa transição, que iniciou já no final do século XIV.
  • O poder de um senhor feudal (poder político) baseava-se na partilha de suas terras entre o maior número possível de súditos e não no montante de sua renda.
  • O rei, buscando consolidar sua monarquia absoluta, e, assim, considerado por Marx como “produto do desenvolvimento burguês”, colaborou para o processo de dissolução da estrutura feudal e a expulsão do campesinato do campo.
  • A nobreza, em oposição à realeza e ao Parlamento, teve uma parcela significativamente maior de colaboração no processo de expulsão dos camponeses da base fundiária, quando passou a usurpar as terras antes comunais para si.  O marco disso é o fenômeno da transformação das lavouras em pastagens de ovelhas para o fabrico da lã, na Inglaterra do século XV.
  • As mudanças que se seguiram a partir dos inclosures assustaram Henrique VII, pois nesta fase inicial o Estado não tinha ainda conhecimento sobre a gestão desse novo sistema que estava emergindo com formação de capital, exploração inescrupulosa e empobrecimento das massas. Como lidar com isso? Desafio para a dinastia Tudor. Formação de políticas públicas para lidar com o novo sistema ou não?
  • O rei e o Parlamento (com o apoio da Igreja) adotaram, sim, algumas medidas legislativas para conter o movimento de arrendamentos (usurpação despovoadora dos mansos comunais) – depopulating inclosurese contra a exploração pastoril despovoadoradepopulating pasture.
  • O Estado tentou evitar a concentração de terras, através de leis que limitavam o tamanho das propriedades ou dos rebanhos.
  • A Reforma foi outro fator que acelerou a expulsão violenta da massa do povo, pois agora integrantes da Igreja Católica perderam seus bens, terras, etc que foram vendidos a preços irrisórios. Além disso, um importante pilar do sistema feudal acabara de ruir e ele estava ligado através de relações de propriedade.
  • A Dinastia Stuart, sob pressão de proprietários fundiários, impôs legalmente a usurpação da terra em todo o continente e também aboliu a constituição feudal. Os proprietários exigiram direito da propriedade privada dos bens, pois possuíam títulos feudais e leis de assentamento, que na prática alienava os camponeses novamente.
  • Com a Revolução Gloriosa e Guilherme III de Orange, a iniciativa privada (por parte de capitalistas e extratores fundiários) sobrepos-se ao controle estatal das transformações graduais que até então vinham ocorrendo. Passaram agora, como diz Marx, a proporções “em escala colossal”.
  • Capitalistas: nova aristocracia fundiária (“extratores de mais-valia fundiários”); burgueses (comercial, industrial) e banqueiros (nova classe emergente oriunda dos manufatureiros e suas medidas restritivas). – pg. 348
  • Século XVIII: 2 formas de usurpação da terra:
  1. Pelo governo: através de leis – Leis Para o Cercamento da Terra Comunal (a terra deveria ser passada para os fundiários, pois eles estavam substituindo os senhores feudais).
  2. Por métodos privados: arrendamentos de capital ou de mercador – foi por esse tipo de “roubo” (segundo Marx) da terra que a maior parte da população foi deslocada para a indústria. – pg. 349
  • Século XIX: último grande processo de expropriação dos camponeses, que ocorreu também na Irlanda e Escócia – neste último o notável trabalho da radical Duquesa de Sutherland. O processo foi apontado por Max como Clearing of Estates (clareação das terras). – pg. 353
  • Desde o final do século XV foram criadas leis sanguinárias contra os expropriados e leis de rebaixamento dos salários, tanto em Inglaterra quanto em França. Os salários eram adequados às necessidades de valorização do capital e aos interesses do capitalista sobre o trabalhador. – pg. 358
  • Já no século XIV havia um Estatuto dos Trabalhadores na Inglaterra e na França (criado em virtude da peste negra), que ditava um salário máximo, mas nunca o mínimo, abrindo assim passagem para a exploração do trabalhador. No século XVI, a situação piorou, pois o salário monetário subiu, enquanto havia depreciação da moeda e suba dos preços, logo, os salários caíram efetivamente. – pg. 360
  • Em 1813, as leis sobre a regulação dos salários caíram, pois não eram mais necessárias, já que o capitalista regulava a fábrica com uma legislação privada.
  • Em 1871, o Parlamento inglês reconheceu legalmente a existência das Trades’ Unions, diante da movimentação do proletariado (greves e lock-outs). – pg. 361-362
  • Percebe-se, portanto, que as ações dos soberanos e dos Estados contribuíram significativamente para elevar a exploração do trabalhado e a acumulação do capital.
  • Os arrendatários na Inglaterra, no século XVI, enriqueceram rapidamente (aumento da renda total) graças aos seguintes fatores:
  1. desvalorização dos metais – queda efetiva nos salários;
  2. elevação dos preços dos produtos (inflação);
  3. preço das terras eram defasados (queda dos preços absolutos). – pg. 364

Como entender a Escola Fisiocrática

Ficha de estudos sobre a apostila Como Entender a Escola Fisiocrática, elaborada por Chantós Mariani – História do Pensamento Econômico I – Prof. Ronaldo Herrlein Jr.

  • França em 1756:  caos social e econômico, agricultura precária e estrutura ainda predominantemente feudal com produção em pequena escala. No norte do país havia uma agricultura mais desenvolvida, com vias ao desenvolvimento capitalista.
  • O sistema de tributação francês da época prejudicava a ascensão da agricultura capitalista, pois todas as classes (exceto nobreza e clero) eram obrigados a pagar pesados impostos e sustentar as classes dominantes.
  • A França da metade do século XVIII era, em suma, uma mistura de traços feudais com insustentáveis características mercantilistas.
  • Fisiocracia = governo da natureza
  • Lema: lassez-faire, lassez-passer.
  • Funções que caberiam ao Estado: garantir o livre comércio, dar a infraestrutura necessária ao escoamento da produção e garantir o direito à propriedade privada.
  • Substituição da mão de obra servil pela assalariada.
  • A agricultura, para os fisiocratas, era a única atividade econômica capaz de produzir produto líquido (excedentes).
  • A classe dos proprietários era improdutiva, mas recebia renda dos produtivos por ser detentora das terras e, assim, permitir que a agricultura se desenvolvesse. Isso, para a fisiocracia, constituía a ordem natural.
  • 1758: publicação do Tableau Économique.
  • Classe Produtiva: empresariado agrícola, camponeses assalariados e demais trabalhadores agrícolas.
  • Classe Proprietária: soberano, nobreza proprietária e o clero – dependem da classe produtiva, mas possuem direito natural de receber tal renda, pois detem as terras e administram o Estado.
  • Classe Estéril: cidadãos ocupados com outros serviços (não agrícolas): artesãos, manufatureiros, comerciantes etc.
  • Produto Líquido = produção – custos
  • Condições para o funcionamento do Quadro Econômico:  1) todos os setores tem de gastar o que produzem (em utilidades, não em futilidades, como estava acostumada a nobreza); 2) a população tem que estar distribuída de maneira adequada nos setores; 3) os produtos tem que ter a forma material adequada e nas proporções certas (insumos agrícolas, materias primas, manufaturas etc).
  • Problemas com o Quadro Econômico:  1)caso a produção não fosse ótima em um determinado ano, o produto não seria totalmente repassado para a classe proprietária e isso comprometeria o ciclo; 2) caso um ou mais setores decidisse não repassar toda a renda para o outro, ficando com uma parte para si na expectativa de acumular capital (poupança), o ciclo também estaria comprometido.
  • A classe proprietária deveria reduzir o consumo de luxo a fim de acumular capital para investir em infraestrutura para o setor agrícola, enquanto que a classe produtiva deveria priorizar os adiantamentos primitivos (gastos com insumos e instalações) para o desenvolvimento econômico do ano seguinte.
  • A tributação, para os fisiocratas, deveria incidir exclusivamente sobre o produto líquido (nele já estavam incluídos os juros).
  • A classe produtiva não podia pagar impostos, pois isso prejudicaria o valor reservado para a produção do ano seguinte ou o fluxo de produto de acordo com o quadro econômico.
  • A classe estéril não podia pagar impostos, pois isso prejudicaria a oferta e demanda dos manufaturados, o que poderia causar elevação dos preços dos produtos, afetando também o Tableau.
  • Turgot, ao participar diretamente do governo de Luís XVI, pôs em prática algumas ideias fisiocráticas de livre comércio interno, abolição de certas obrigações feudais, fim de monopólios, imposto único para os proprietários e maior liberdade social (abertura da sociedade estamental).
  • A Fisiocracia deixou um importante legado no estudo econômico, através dos conceitos de produto bruto e produto líquido e o próprio Tableau Économique, que vai servir de base para pensadores posteriores.

O Valor na Ciência Econômica

Resumos sobre a introdução do livro O Valor na Ciência Econômica, de Cláudio Napoleoni – História do Pensamento Econômico I – Prof. Ronaldo Herrlein Júnior

O conceito de “valor” em Economia pode ser definido de três formas:

  1. Valor é uma categoria da economia mercantil (ou economia de troca) irreversível e superior às formas anteriores, as quais seriam “grosseiras” e “primitivas”, segundo Smith = definição pré-marxista
  2. Valor é a categoria fundamental da economia mercantil. Entretanto, esta é um modo de produção e aquele é algo indissolúvel ao tempo histórico = definição marxista
  3. Valor é uma categoria da atividade econômica em geral, atuando como regente na economia, independente da efemeridade ou durabilidade de um determinado modo de produção = definição pós-marxista

ORIGEM DA CIÊNCIA ECONÔMICA

A Economia como ciência surgiu somente quando o sistema capitalista passou a consolidar-se, ou seja, meados do século XVIII, com a efetiva ascensão da classe burguesa,  graças às revoluções, Industrial e Francesa. Antes disso, questões econômicas eram discutidas no campo da Filosofia, da Moral, do Direito e da Política.

A primeira fase da evolução histórica da ciência econômica pode ser analisada segundo duas formas de utilização da mão de obra: o esclavagismo (utilizado na Antiguidade) e a servidão (utilizada na Idade Média). Ambas tinham em comum a característica de que os meios de produção eram completamente afastados dos trabalhadores, os quais representavam mercadoria (no caso da escravidão) e alienação total a terra (no caso da servidão). Eram, portanto, meros instrumentos da produção.  Falando-se especificamente do Feudalismo, a produção econômica majoritariamente era utilizada pelo senhor, para o seu consumo. O senhor era detentor dos meios de produção e da própria produção. A idéia de consumo, para um senhor feudal, estava atrelada tão somente a atividades consideradas “extraeconômicas” na época, como cultura ou guerra, por exemplo. Logo, produção, no sistema feudal, era subordinada ao consumo para o senhor. O colapso deste sistema que tinha como eixo a figura do proprietário (o senhor) se dá quando, em fins do século XV, o consumo passa a interessar também às outras classes (artesãos, vilões, servos, e mais tarde, burguesia). Assim, os trabalhadores passam a vender sua força de trabalho e os proprietários, por sua vez, orientam o processo econômico pela aquisição dessa mão de obra, segundo seus interesses. A principal diferença, ao entrarmos de fato no sistema capitalista, é que o consumo torna-se produtivo e está intrínseco à produção, sendo relevante o consumo tanto dos operários quanto dos capitalistas.

O processo econômico encontra autonomia na medida em que sai da subordinação a uma classe específica (no caso, a nobreza feudal) e passa a envolver todas as demais classes no processo produtivo e na lógica da evolução do capital. Nesse momento, portanto, a ciência econômica assume relevância e independência das demais áreas por protagonizar o próprio andamento histórico, graças ao capital.

O PRODUTO LÍQUIDO SEGUNDO A FISIOCRACIA

A França de meados do século XVIII ainda era ainda uma nação predominantemente rural, com uma economia majoritariamente voltada para o campo, onde aí se concentrava a maior parte do capital francês. Nesse cenário surgiram os fisiocratas, os quais na época se autoentitularam “os economistas”, sob a figura principal de François Quesnay.

Os fisiocratas formularam dois postulados econômicos:

  1. A condução capitalista da agricultura é excelente para a organização do processo produtivo. Logo, as atividades agrícolas são fundamentais para alavancar o desenvolvimento capitalista no país.
  2. As manufaturas são manifestações de um caráter intrinsicamente não capitalista.

Nota-se que no pensamento fisiocrático havia uma desconsideração da influência das atividades industriais (talvez por tais ideias terem emergido naquele contexto francês), as quais seriam mais prósperas na lógica do desenvolvimento capitalista, conforme comprovou a ascensão britânica através da Revolução Industrial.

A fisiocracia criou um termo chave para os estudos econômicos posteriores: o produto líquido, que significa a parte da produção social total que excede a reconstituição necessária à criação da própria produção. Para os fisiocratas, o PL é formado somente na agricultura, pois só neste setor há formação de sobreproduto, não há apenas a transformação de matéria prima em produção, como ocorre nos demais setores. Logo, os fisiocratas acreditavam que somente a agricultura possuía trabalho produtivo, ou seja, trabalho que produz sobreproduto.

Segundo o modelo de sociedade fisiocrática, haveria 3 classes:

  1. PROPRIETÁRIOS FUNDIÁRIOS: possuidores da terra (meio de produção).
  2. TRABALHADORES ASSALARIADOS: mão de obra (população economicamente ativa ou produtiva).
  3. TRABALHADORES ESTÉREIS: trabalhadores de outros setores que não o campo (improdutivos).

Assim, o produto líquido proposto pela fisiocracia significa a própria renda dos proprietários fundiários, já que eles seriam os verdadeiros capitalistas de tal esquema. Consideram, também, que todos os trabalhadores do campo são assalariados.

A relação econômica entre as 3 classes da sociedade foi organizada por Quesnay no chamado Quadro Econômico (Tableau Économique), na qual se pode notar a clara substituição das relações mercantis baseadas na troca para as mediadas pelo uso da moeda. Mesmo assim, os fisiocratas não criaram uma teoria do valor propriamente dita. A moeda em questão era uma mercadoria de uso comum aceita por todos na troca e pela qual eram medidos os valores.

Analisando o Tableau, percebe-se que o produto líquido, após circular pela classe estéril (onde os produtivos adquirem manufaturados), acaba retornando para a classe produtiva (pois os estéreis precisam adquirir matéria prima para produzir novos produtos manufaturados e, assim, gastam sua renda). Cada classe, portanto, fica em posse daquilo que precisa para desempenhar o seu papel na sociedade fisiocrática, sendo que os produtos são deslocados dos processos em que foram obtidos para os que são necessários para a sua produção.