Autoritarismo, Crescimento Econômico e Esgotamento do Modelo de Desenvolvimento (1964-1984)

GREMAUD, A. et al. Autoritarismo, crescimento econômico e esgotamento do modelo de desenvolvimento (1964-1984). In _____ Formação Econômica do Brasil. São Paulo: Atlas, 1997. p. 167-229.

  1. 1964/67: estagnação decorrente da política de estabilização, houve profundas reformas institucionais;
  2. 1968/73: “milagre econômico”, contexto internacional favorável, altas taxas de crescimento e relativo controle inflacionário;
  3. 1974/79: tendência à retração do crescimento, por desequilíbrios intersetoriais e pelo choque do petróleo.

Do golpe militar à abertura política: principais fatos políticos dos governos militares

  • O governo militar administrou e transformou o país por meio de atos institucionais e decretos centralizando o poder no Executivo.
  • Castelo Branco (1964-67): pretendia eliminar os “maus elementos” e retomar uma “democracia restringida”, idealizada pelo grupo da Sorbone, composto por militares próximos à ESG e que entendiam a intervenção militar como temporária, eram mais liberais economicamente.
  • AI-1 (09/04/1964): suspensão de direitos políticos, instauração do “decurso de prazo”; início da formação de um quadro institucional repressivo, através da criação do SNI e da “operação limpeza”.
  • AI-2 (1965) e AI-3 (1966): estabelecimento de eleições indiretas; mais poderes ao Executivo como o de fechar o Congresso; reformula o sistema partidário.
  • AI-4 (1966): reabriu o Congresso e este foi convocado a aprovar uma nova constituição em 1967, que enfraqueceu a estrutura federativa e centralizou poderes no Executivo.
  • Costa e Silva (1967-69): considerado “linha dura”, militares mais nacionalistas e que acreditavam em forte controle armado sobre a sociedade civil, daí o aumento da repressão aos grupos de oposição ao regime, principalmente os de esquerda (ALN, AP, MR-8, VPR, etc).
  • AI-5 (1968): conferia poderes ao Presidente para fechar o Congresso, interferir nas esferas municipais e estaduais, cassar políticos, funcionários públicos e membros do judiciário, além de introduzir a censura, a tortura e uma nova “caça às bruxas”.
  • Junta Militar (1969): Lira Tavares (Exército), Augusto Rademaker (Marinha) e Márcio de Souza e Mello (Aeronáutica); Emenda Constitucional n.1, incorporando medidas repressivas ao corpo constitucional.
  • Em 1969, o uso da tortura foi intensificado, com a criação de órgãos como a OBAN (Operação Bandeirantes), depois substituída pelo DOI-CODI.
  • Médici (1969-74): também “linha dura”, intensificou o combate à guerrilha urbana, eliminando focos de resistência; a propaganda e o bom desempenho econômico eram fortemente utilizados para mascarar a repressão, esconder os problemas sociais e legitimar o regime (Brasil Grande Potência, “Pra Frente Brasil”, etc).
  • Geisel (1974-79): do grupo castelista, preocupado com a institucionalização do poder diante da perda de apoio político; impôs o II PND; início da “distensão política”, em razão de 1) fortalecimento de grupos sociais organizados pela via pacífica, que contaram com o apoio da igreja, 2) necessidade de controle dos organismos de repressão → “poder dentro do poder”; “Pacote de Abril”;

As reformas institucionais introduzidas pelo PAEG

  • O PAEG (Programa de Ação Econômica do Governo) foi um plano de estabilização com amplo espectro de reformas institucionais. Objetivo principal: combate à inflação, diagnosticada como problema de excesso de demanda. O processo reformista resultou de uma aliança entre militares e tecnocratas. O controle à inflação se deu por controle monetário, redução do déficit público e contenção salarial. O plano permitia o convívio com a inflação, através da correção monetária.
  • Reforma Fiscal: caracterizada pela “regressividade” do sistema (alta participação de impostos indiretos, concentrados nos níveis de renda inferiores) e pela profunda “centralização” da arrecadação e das decisões do governo. O déficit público foi reduzido com o aumento dos impostos e de outras fontes de receita (fundos parafiscais), com o “realismo tarifário”das empresas estatais e com a criação das ORTN, forma de financiamento não inflacionária dos déficits.
  • Reforma nas Relações Exteriores: eliminação de restrições, simplificação de procedimentos, incentivos fiscais para exportação e uso da política tarifária e da política cambial (a partir de 1968 com as minidesvalorizações); reestruturação da dívida externa e garantias para o capital estrangeiro.
  • Reforma Trabalhista: fim da estabilidade do emprego (substituída pelo FGTS) e nova política salarial, substituindo as negociações entre sindicatos e patrões por um índice de reajuste determinado pelo governo, diante da necessidade de impedir que reajustes descontrolados pressionassem a inflação. Houve grande arrocho com esta política, com redução do salário mínimo real de 18%.
  • Reforma Monetário-Financeira: objetivo de ampliar o volume de poupança e criar mecanismos adequados de financiamento da atividade econômica, através de medidas como:
    1. Garantir rentabilidade real positiva para os ativos: através da correção monetária e a criação de ativos com taxas de juros nominal pós-fixadas (CM+retorno real garantido);
    2. Possibilitar o controle monetário: criação do CMN e do BACEN; BB continuou como “banqueiro do governo” responsável pelo Crédito Rural e realizando operações em nome do Tesouro, além de poder recorrer à Conta-Movimento.
    3. Segmentar o mercado: a partir da vinculação entre as formas de captação e de aplicação, com instituições especializadas atuando em cada segmento, garantir-se-ia o desenvolvimento de todas as linhas de financiamento beneficiando vários setores da economia. Redesenhou-se a estrutura do sistema financeiro nacional, aliado à reforma do mercado de capitais;
    4. Aproximar-se do sistema financeiro internacional: através de resoluções que aumentaram a flexibilidade das instituições financeiras e permitindo às empresas fazer a arbitragem.
  • O PAEG é importante pela mudança “qualitativa” a que se propunha, nesse sentido pode ser entendido como uma adaptação do marco institucional a um novo estágio de desenvolvimento econômico.
  • Resultados: arrocho salarial; profunda alteração da relação capital-trabalho; o combate à inflação implicando redução da demanda se fez com imposição das perdas às classes trabalhadoras de renda mais baixa e às pequenas e médias empresas; aumento da massa de recursos à disposição do Estado; autonomia financeira das estatais; captação de recursos externos/endividamento.

Desempenho econômico ao longo do regime militar

  • O desempenho da economia durante o período seguiu o comportamento da indústria: ao longo do milagre o crescimento do PIB ficou em torno dos 11% e da indústria 13% a.a; de 1974/79 as taxas de crescimento industrial e do PIB caíram para 7% em média; nos anos 1980, a indústria praticamente não cresceu, apenas 0,2% e o PIB 1,6% a.a.

Crescimento industrial: milagre, II PND e crise

Milagre econômico

  • Novo diagnóstico da inflação: “de custos”, portanto promoveu-se o fortalecimento do controle de preços (CIP), manteve-se a política salarial, utilizou-se mecanismos de controle de taxas de juros e estimulou-se a concentração bancária (promoveria redução de custos decorrentes de economias de escala).
  • Nova política econômica: atenuam-se os controles sobre o crédito, levando a uma grande expansão (crédito agrícola e ao consumidor), ampliação dos gastos públicos (infraestrutura) e dos incentivos e subsídios para setores prioritários como as exportações e regiões atrasadas.
  • “O aumento dos gastos públicos foi o indutor inicial do crescimento, com importantes efeitos dinâmicos sobre o restante da economia”.
  • Setor líder do crescimento: bens de consumo duráveis, em razão da grande expansão do crédito ao consumidor (expansão na fonte de recursos como nos estímulos) → crescimento vertical → a economia foi “redinamizada” com base no endividamento familiar.
  • Setor da construção civil: apresentou forte dinamismo graças aos investimentos públicos em infraestrutura, à grande expansão do crédito habitacional e à retomada do investimento industrial.
  • Setor de bens de consumo não duráveis: cresceu, mas abaixo dos BCD, em razão da política salarial; o crescimento se deu pelo aumento da exportação de manufaturados, graças aos incentivos fiscais e creditícios.
  • Setor de bens de capital: forte crescimento, mas abaixo dos BCD e não foi capaz de atender à demanda crescente provocada pelo aumento dos investimentos, logo, aumentou a importação de bens de K → política liberalizante do Conselho de Desenvolvimento Industrial funcionou como freio ao desenvolvimento da indústria nacional de bens de capital.
  • Setor de bens intermediários: bom desempenho graças ao investimento das estatais, mas não foi suficiente para evitar que surgissem estrangulamentos na oferta interna desses bens, levando à importação.
  • Houve aumento de investimento industrial tanto das empresas estatais quanto das privadas. O crescimento dos investimentos das estatais se deu pela recomposição tarifária que ampliou a autonomia financeira das mesmas, e pela “lógica privada” dessas empresas.
  • Houve um crescimento desequilibrado → desproporcionalidades setoriais. Isso revela o caráter “cíclico” da economia: quando atingiu o PIB potencial surgiram pontos de estrangulamento que gerariam pressões inflacionárias e desequilíbrios externos → desaceleração e surgimento de capacidade ociosa. Não foi o que ocorreu, em razão do crescimento das importações, que conteve a inflação junto com o CIP. O aumento da capacidade de importar se deu em contexto internacional favorável, com grande liquidez internacional, provocando influxo de capitais externos no país.
  • Ocorreu um processo de concentração de renda, apesar do crescimento da renda per capita. A concentração, para Furtado e Singer, por exemplo, era oriunda da política salarial e das reformas trabalhistas e do autoritarismo, que enfraqueceram o poder das classes trabalhadoras.
  • Em 1973 verificou-se a maior taxa de crescimento e de investimento, além de pressões inflacionárias, que foram contidas. Houve aumento das importações e das exportações e entrada de capitais. Havia desequilíbrios estruturais crescentes e estes foram agravados pelo choque do petróleo.

O II PND

  • A tendência em 1974 era de reversão do ciclo expansivo, por condicionantes internos (desequilibrada estrutura produtiva do país) e externos (o primeiro choque do petróleo). A economia já operava acima do PIB potencial, demandando grandes volumes de importações de bens de K e matérias-primas, acentuando as pressões inflacionárias e a tendência aos déficits externos.
  • II PND: objetivo de superar a crise sem sacrificar o desenvolvimento → contexto político sobrepondo-se à lógica econômica.
  • Fiori: o modelo adotado para lidar com as contradições políticas e sociais foi a fuga para frente, acomodando os conflitos com base no crescimento contínuo, forma de legitimar o sistema e aquietar as instabilidades sociais.
  • Não se tratava de incentivar um crescimento desequilibrado, mas sim orientá-lo na direção de setores relativamente atrofiados (insumos básicos e bens de K).
  • A ampla liquidez internacional seria utilizada para o crescimento sem precisar gerar no CP o excedente para transferência à OPEP. O financiamento externo permitiria fechar o BP no CP. Os investimentos para “completar a matriz industrial brasileira” permitiriam avanços na capacidade de exportar e gerariam poupança para pagamento da dívida.
  • Principais setores contemplados: insumos básicos, minérios, petroquímica, fertilizantes, infraestrutura, energia (nuclear, hidroelétrica, Proalcool), bens de capital (incentivos fiscais, garantias de demanda, crédito, garantia de política de preços para o setor privado) etc.
  • O II PND pode ser encarado como uma continuidade no processo de substituição de importações, mas avançou para os bens de produção. → ampla mudança na política industrial → prioridade indústrias básicas.
  • Consequência política: desagradou o capital estrangeiro e o capital nacional vinculado aos bens duráveis. Para contornar, o governo elegeu as empresas estatais como “agentes das mudanças” e promoveu uma “estratégia de redução dos desequilíbrios regionais” (distribuição dos projetos de investimento), angariando força política dos oligarcas tradicionais ao Plano, além de ter conseguido apoio do capital nacional vinculado às empreiteiras e do capital nacional financeiro.
  • Avaliação do II PND:
    • Críticos: o legado foi o encilhamento fiscal do Estado e ampliação da vulnerabilidade externa;
    • Defensores (Castro & Souza): o plano possuía “profunda racionalidade econômica”, porque em 1973 foi o ano de maior taxa de investimento do milagre, na suposição de que o crescimento acelerado deveria prosseguir (safra de investimentos a ser colhida); e, havia um “desequilíbrio da estrutura produtiva”, que o plano pretendia a longo prazo modificar → os investimentos sustentaram a conjuntura impedindo uma descontinuidade de consequências.
  • O plano foi bastante exitoso, pelo menos no setor de bens intermediários. Para Castro, o II PND não foi adiamento do enfrentamento dos problemas, mas das soluções e seus resultados vieram nos anos 1980, com diminuição da relação importações/PIB → avanço no PSI e por ter aberto novas frentes de exportação, principalmente dos intermediários.
  • O II PND “fechou a matriz industrial brasileira”, mas não conseguiu internalizar geração de progresso técnico, continuando a dependência externa. A ampliação da produção de bens antes importados e novas frentes de X se fez através da intervenção do Estado no investimento, aumentando o passivo estatal, que geraria dívida na década seguinte.
  • Questão distributiva: o plano visava a resolver hiato de divisas e desproporcionalidade da estrutura produtiva, diminuindo as disparidades de distribuição de renda regional e pessoal. A renda pessoal não melhorou → “primeiro o bolo deveria crescer para depois distribuir”.

Modernização agrícola

  • A participação da agricultura no produto foi menor que a da indústria, durante o regime militar, em razão do tipo de crescimento econômico de base industrial. Contudo, os dados não contemplavam a agroindústria, que, estima-se, representava 10% do PIB.
  • Houve uma clara política de incentivo à agricultura, através de crédito subsidiado (SNCR e PGPM – Política de Garantia de Preços Mínimos) e auxílio técnico (Embrapa). Isso contribuiu para a modernização do setor, que era entendida como benéfica para aumentar a produção de alimentos/matéria-prima e sua exportação além de criar um mercado consumidor para produtos urbano-industriais.
  • Essa modernização tinha caráter capital-intensiva, poupadora de mão-de-obra e de terra, marcada pela mecanização e pela quimificação. A penetração desses “novos insumos” foi extremamente concentrada, ligada ao crédito subsidiado.
  • Houve crescimento da produtividade e da área cultivada, assim como uma diversificação agrícola (novos produtos como soja e laranja) e um nítido predomínio das culturas de exportação (problemas de abastecimento interno e pressionou os preços), além do deslocamento da fronteira agrícola para o centro-oeste.
  • Consequências da modernização do campo: efeitos sobre a estrutura fundiária (aumento da concentração de terra) e sobre as relações de trabalho (não teve efeitos importantes sobre o nível de emprego e as relações de trabalho eram predominantemente temporárias). A piora na distribuição de renda no campo e a ampliação das desigualdades regionais também são resultados dessa “modernização dolorosa”.

Financiamento do crescimento

  • Graças ao PAEG, o sistema financeiro teve um crescimento significativo em torno de 10% do PIB. Características:
    1. Aprofundamento financeiro: crescimento da relação haveres financeiros/PIB e crescimento dos haveres não monetários (1971 em diante) → “financeirização” da economia → endividamento famílias, empresas e governo. Desenvolvimento do mercado de títulos públicos federais. Letras de câmbio tiveram importância durante o milagre, pois os recursos iam para crédito ao consumidor; depois foi a Caderneta de poupança o ativo mais importante.
    2. Concentração e conglomeração do sistema: a concentração era um objetivo das autoridades monetárias para facilitar a administração e fiscalização do sistema e para reduzir as taxas de juro com possíveis ganhos de economia de escala; assim, aumentou o poder dos grandes bancos. A conglomeração dos bancos foi uma resposta ao objetivo de segmentação da reforma 1964/66 e da perda de importância dos ativos monetários, assim passaram a atuar em diferentes segmentos do mercado financeiro associados a agências financeiras extrabancárias, o que potencializa sua massa de recursos.
    3. Estrutura de financiamento: empréstimos ao setor privado aumentaram até 1975, sendo que a partir de 1973 a participação do sistema não monetário predominou. O BB era agente central do SNCR e ainda podia utilizar a conta-movimento (o comportamento de suas operações ativas tornam-se independentes de sua captação). O BNDES teve participação reduzida durante o milagre, mas retomou seu papel no II PND. Houve crescimento do SFH e das cadernetas de poupança. As empresas privadas nacionais continuaram contando com recursos próprios, enquanto as multinacionais recorriam a recursos externos. As estatais passaram a ter maior autonomia graças ao realismo tarifário e no II PND captaram recursos do exterior.
    4. Endividamento externo: havia grande liquidez internacional, assim ingressaram no país US$ 12,8 bilhões (1967-73), 6,5 bi tornaram-se reservas, mas os recursos que ingressaram não correspondiam à necessidade de poupança para financiar os investimentos. O crescimento das reservas era fator de expansão da base monetária, o que acarretou endividamento público interno. Havia dois indutores para a captação externa: o prazo e o diferencial de custos e com isso houve absorção do capital financeiro internacional e expansão dos ativos financeiros internos. Durante 1974-79, em função do choque do petróleo, as estatais foram forçadas a captar recursos externos, pois também havia ampla liquidez, ocorrendo nesse período ampliação do endividamento → estatização da dívida externa.

Estabilização e Reforma: 1964-1967

ABREU, Marcelo de Paiva et al. Estabilização e reforma: 1964-1967. In: ______ A Ordem do Progresso: Cem Anos de Política Econômica Republicana 1889-1989. Rio de Janeiro: Campus, 1989. p. 213-231.

Os Objetivos do PAEG

  • Ministro da Fazenda Otávio Bulhões e do Planejamento Roberto Campos.
  • Objetivos: acelerar o desenvolvimento econômico; conter o processo inflacionário; atenuar desníveis econômicos setoriais e regionais; corrigir os déficits do balanço de pagamentos que ameaçam o desenvolvimento pelo estrangulamento da capacidade de importar.
  • Instrumentos de ação
    1. Política financeira
      • Política de redução de déficit de caixa governamental: para aliviar a pressão inflacionária e fortalecer a capacidade de poupança nacional;
      • Política tributária: fortalecer a arrecadação e combater a inflação;
      • Política monetária: evitar reduzir nível de atividade produtiva e capacidade de poupança das empresas;
      • Política bancária: fortalecer sistema creditício;
      • Política de investimentos públicos: fortalecer a infraestrutura econômica e social do país.
    2. Política econômica internacional
      • Política cambial e de comércio exterior: diversificação das fontes de suprimento e incentivo às exportações, utilizar a capacidade ociosa;
      • Política de consolidação da dívida externa e de restauração do crédito no exterior: aliviar pressões de curto prazo no BP;
      • Política de estímulo ao ingresso de capitais estrangeiros e de ativa cooperação técnica e financeira com organismos internacionais, com outros governos e com a Aliança para o Progresso.
  • Política de produtividade social
    • Política salarial
    • Política agrária
    • Política habitacional
    • Política educacional.
  • O programa acentuava a importância de manter ou recuperar as taxas de crescimento da economia; a inflação deveria ser combatida para não ameaçar a atividade produtiva; a restrição do BP também era uma séria limitação.
  • O PAEG propunha política de incentivo às exportações, opção pela internacionalização da economia abrindo-a ao capital estrangeiro, promovendo a integração com centros financeiros internacionais e “explícito alinhamento” com os EUA.
  • Diagnóstico heterodoxo da inflação, que a associa à poupança forçada. Atribui à inconsistência na esfera distributiva da economia a causa da inflação e vê na expansão monetária veículo de propagação dessas pressões.
  • Três causas “tradicionais” da inflação brasileira, segundo o PAEG: déficits públicos, expansão do crédito às empresas e majorações salariais superiores ao aumento da produtividade.
  • Programa desinflacionário
    1. Contenção dos déficits governamentais (corte de despesas e racionalização do sistema tributário);
    2. Crescimento dos salários reais proporcional ao aumento da produtividade e à aceleração do desenvolvimento;
    3. Política de crédito às empresas “suficientemente controlada”, para impedir excessos da inflação de procura e “suficientemente realista” para adaptar-se à inflação de custos.

Política Salarial no PAEG

  • Três pontos principais
    1. Manter a participação dos assalariados no produto nacional;
    2. Impedir que reajustes salariais desordenados realimentem o processo inflacionário;
    3. Corrigir as distorções salariais (no serviço público federal, autarquias e sociedades de economia mista).
  • Quadros/Goulart (1961-64): apesar dos reajustes frequentes, o salário mínimo real caiu aproximadamente 20%.
  • 1965: Circular nº 10 determinava a forma do reajuste salarial da administração pública federal, recomendada também aos estados e municípios. Sobre o salário real médio deveria incidir a taxa de produtividade e metade da inflação programada pelo governo para o ano anterior (resíduo inflacionário), além do princípio da anuidade dos reajustes. O julgamento da essencialidade cabia ao governo.
  • Com a repressão, as negociações diretas entre trabalhadores e empregadores foram substituídas pela fórmula de reajuste fornecida pelo governo.
  • Efeitos da política salarial sobre o salário mínimo real médio: queda de 7% em 1965, mais uma redução de 7% em 1966; nos anos seguintes o ritmo da queda foi reduzido. Também houve queda do salário real médio na indústria de transformação até 1967.

Condução das Políticas Monetária e Fiscal

  • Os impostos diretos e indiretos foram imediatamente aumentados, diminuindo o déficit do governo de 4,2% em 1963 para 1,1% em 1966. O déficit foi alterado em sua forma de financiamento, em 1966 sendo totalmente por empréstimos junto ao público.
  • As políticas monetária e de crédito, entretanto, foram mais “erráticas”.
    • A partir de 1965, tais políticas foram “folgadas”, elevando a liquidez real; a expansão monetária naquele ano esteve acima do crescimento dos preços;
    • Esta “descalibragem” na política monetária se deve ao resultado do BP que foi favorável em razão do aumento de empréstimos/financiamentos do exterior em 65%, além de os investimentos diretos quase triplicarem.
    • A política monetária não foi suficientemente ágil para esterilizar o influxo de moeda gerado pelo superávit externo (queda nas importações, recorde nas exportações, reservas dobraram).
    • A partir de 1966, as políticas tornam-se “apertadas”, reduzindo a liquidez real e inibindo um pouco o crédito ao setor privado, não fossem os empréstimos do Banco do Brasil que se expandiram.

O Impacto sobre a Produção e os Preços

  • Qual o impacto sobre os preços e o produto das políticas do PAEG?
  • Os preços elevaram-se em 1964 em razão do aumento nas tarifas dos serviços públicos, da liberação dos alugueis congelados e de outros preços: “inflação corretiva”, para o governo.
  • Os salários dos militares foram aumentados em 120%, enquanto dos empregados civis 100%.
  • O crédito ao setor privado expandiu-se a taxas menores do que a moeda, em 1964.
  • O relativo alívio na liquidez permitiu pequena recuperação da produção industrial, que cresceu em torno de 5%.
  • 1965: início da queda da curva inflacionária – cronologia:
    • 1963: segundo trimestre a atividade industrial entra em recessão;
    • 1964: alívio na liquidez real permitiu pequena recuperação industrial, mas os preços continuavam elevando-se;
    • 1965: abrupta quebra na tendência de crescimento dos preços agrícolas e industriais;
    • 1966: queda no ritmo de crescimento da moeda; crescimento industrial de 11% em razão do crédito fácil e da utilização da capacidade ociosa acumulada; agricultura tem mal desempenho; nova redução salarial; inflação declina mas em nível muito menor do que em 1965.
  • 1966: mudança na política para uma ortodoxia monetarista. O déficit reduz-se a 1,1% do PIB em razão da elevação dos impostos e do corte nas despesas; o financiamento do déficit era por títulos públicos e empréstimos externos – primeira vez que o déficit da união era financiado sem recurso à emissão.
  • Os empréstimos dos bancos comerciais ao setor privado melhoraram principalmente pela ação do Banco do Brasil, que expandia seus empréstimos mais que outros bancos, evitando que a política monetária restritiva atingisse plenamente o setor privado.
  • 1967: quadro já era nitidamente recessivo, com desaceleração da atividade industrial, reflexo da relação entre as políticas fiscal, monetária e creditícia restritivas, que constituem os aspectos ortodoxos da estabilização pós-1964.

Os Custos da Estabilização

  • Quais os custos da experiência com a ortodoxia? Em primeiro lugar, o desemprego.
  • Outro impacto foi sobre as empresas, especialmente as pequenas, cujo número de falências/concordatas triplicou entre 1964-66, sendo os setores mais atingidos os de vestuário, alimentos e construção civil. Este último setor em razão da política fiscal que reduziu as despesas com obras públicas; como se trata de setor intensivo em mão-de-obra há, portanto, um caráter socialmente regressivo quando paralisado.
  • A partir de 1966, iniciou o influxo de capitais externos, gerando superávits crescentes na conta capital, mas apenas 6,5% desses empréstimos foram contratados por empresas nacionais privadas e se tratavam na maioria de empréstimos para filiais brasileiras de multinacionais junto às suas matrizes (facilitado pela Instrução 289).
  • Como a política fiscal restritiva afetou a composição das despesas públicas? Em 1965, a maior queda na participação foi do Ministério da Viação e Obras Públicas, enquanto o Ministério da Guerra aumentou seus gastos em 10,4%. Em 1966 os ministérios do Trabalho e da Previdência social reduzem participação na despesa.

Além da Ortodoxia Simplista

  • Até que ponto o PAEG foi ortodoxo?
  • A ortodoxia começa no diagnóstico da inflação, cuja causalidade se dá pela excessiva expansão monetária e creditícia que causam pressões inflacionárias. O nível de produto ou a taxa de crescimento são considerados independentes da taxa de expansão da moeda, que se está em excesso, é em razão de “incompetência”, “clientelismo populista” e “excessiva intervenção governamental”. Isso se materializa no excesso de despesa do governo sobre a receita e no financiamento deste déficit pela emissão. A inflação, assim, seria resultado da intervenção do governo na economia. Para combatê-la, os ortodoxos recomendam políticas monetária e creditícia restritivas, além de uma política fiscal restritiva para reduzir as pressões de demanda no sistema. No setor externo também optam pelo liberalismo, sugerindo câmbio “realista” e redução da proteção tarifária à indústria oligopolística. O excesso de moeda gera excesso de demanda, refletindo-se no mercado de trabalho, que, quando a economia está aquecida, apresenta redução do desemprego e elevação dos salários nominais acima do nível geral de preços, gerando pressões inflacionárias. Assim, quando se corrigem os excessos das políticas monetária/fiscal os mercados ajustam-se às novas condições, exceto o mercado de trabalho, cujos salários resistem a adequar-se aos preços.
  • A versão mais recente do monetarismo associado às expectativas racionais e à macroeconomia dos mercados em equilíbrio encara o mercado também como em permanente equilíbrio, sendo recomendável evitar o excesso de oferta monetária adotando regras para expansão da moeda e do crédito.
  • Nesse sentido, o PAEG não foi totalmente ortodoxo, pois havia demasiada preocupação em manter as taxas de crescimento e havia alguma tolerância com a inflação, combatida de forma gradualista. O diagnóstico era que a inflação decorria de uma “inconsistência da política distributiva”, e isso poderia ser resolvido através da política creditícia, “suficientemente controlada para impedir os excessos da inflação de procura, mas suficientemente realista para adaptar-se à inflação de custos”.
  • O PAEG propôs então uma série de reformas institucionais, identificadas como necessárias para a estabilização, que tinham o objetivo de atacar:
    1. A desordem tributária: introduziu-se o mecanismo da “correção monetária”, permitindo uma reforma completa do sistema tributário;
    2. As deficiências de um mercado financeiro subdesenvolvido a inexistência de um mercado de capitais: criação do BACEN, modernizando o sistema financeiro; criação do Banco Nacional de Habitação, dentro do programa de reforma habitacional, que junto com PIS e PASEP tornaram-se de captação de poupança privada forçada. O sistema financeiro moderno mais a correção monetária criaram condições para captação de poupança privada voluntária, que financia o Tesouro e o investimento privado.
    3. As ineficiências e restrições ligadas ao comércio exterior: a possibilidade de recorrer a empréstimos externos em moeda estrangeira teve efeitos regressivos, privilegiando apenas empresas estrangeiras e grandes empresas estatais e, para este influxo de capitais, foi necessário conquistar confiança das agências internacionais, através de demonstrações de ortodoxia. A restrição no BP, assim, teve papel decisivo na opção pela ortodoxia.
  • Os pilares do PAEG da política desinflacionária foram as reformas institucionais e a política salarial. A fórmula oficial de reajuste substituiu a negociação dos salários e acabou reduzindo o salário mínimo a cada ano até 1974, o que pode ser chamado de “compressão salarial”. A repressão sobre os sindicatos solucionou o conflito distributivo reduzindo a parcela salarial, o que a ortodoxia faria através de recessão e desemprego.
  • Se foi diagnosticada que a causa da inflação era o conflito distributivo, por que o PAEG insistiu na prática de políticas fiscal e monetária restritivas ortodoxas? Porque acreditavam que, embora houvesse deterioração da distribuição de renda, isso seria preferível ao desemprego e à recessão. Ainda, insistiu-se na ortodoxia para agradar aos órgãos financeiros internacionais e atrair capitais.