Maldita Guerra: Nova História da Guerra do Paraguai [Conclusões]

Resumo das conclusões do livro Maldita Guerra: Nova História da Guerra do Paraguai, de Francisco Fernando Monteoliva Doratioto – Política Externa Brasileira I – Prof. André Luis Reis da Silva.

  • Objetivos do Império brasileiro em relação ao Paraguai:
  1. livre navegação no rio Paraguai, para comunicar a província de MT com o restante do Brasil.
  2. buscar um tratado de fronteiras com o Paraguai, para ratificar a expansão territorial do período colonial.
  3. conter a influência argentina sobre a região, que tinha ambições de restabelecer o Vice-Reino da Prata, através de Rosas.
  • A partir da segunda metade do século XIX o Império passaria a se preocupar mais com questões externas, pois antes estava mais preocupado com a consolidação do Estado monárquico e com seus problemas internos.
  • Havia uma preocupação com os interesses argentinos, pois isso poderia insuflar o separatismo gaúcho, caso a Argentina exercesse alguma forma de dominação/influência sobre o Paraguai. 
  • Visconde do Uruguai (Paulino Soares de Souza): elaborou uma estratégia para conter Rosas, através da aliança com a oposição interna argentina – José Urquiza, governador de Entre Ríos – e com os colorados uruguaios. Derrotaram o blanco Oribe, no Uruguai (1851) e derrotaram Rosas em uma batalha em 1852.
  • Surgem dois Estados argentinos: Buenos Aires e a Confederação Argentina.
  • 1844-52: Império travou boas relações com o Paraguai, reconhecendo sua independência (1844) e apoiando política e militarmente os paraguaios na disputa com Rosas pelo acesso ao mar.
  • Divergências Brasil-Paraguai: 
  1. a queda de Rosas (1852) pôs fim a um inimigo comum entre Brasil e Paraguai.
  2.  O novo presidente, Carlos Antonio López, criou obstáculos à navegação brasileira no rio Paraguai e reivindicava a delimitação das fronteiras no rio Branco.
  • 1856: tratado entre Brasil e Paraguai, que garantia a livre navegação ao Império brasileiro e postergava a questão das fronteiras.
  • José Gaspar de Francia (1816-40): o Paraguai isolou-se diplomaticamente, manteve-se independente em relação a Buenos Aires e incentivou a criação de uma burguesia rural, acumulando riquezas a partir da agricultura.
  • Carlos Antonio López (1844-62): modernizou o país, importando maquinário e técnicos da Inglaterra, e tentou reinserir o Paraguai no comércio internacional. Para isso, precisava de acesso ao mar e passou a militarizar o país para uma possível atuação defensiva na região.
  • 1862: reunificação argentina, sob a presidência de Bartolomé Mitre, criando a República Argentina. Isso desagradava a províncias como Entre Ríos e Corrientes, federalistas, que reivindicavam a nacionalização da renda obtida pela alfândega de Buenos Aires, pois todo o comércio exterior argentino passava por ali.
  • A Argentina passou a apoiar os colorados contra os governantes blancos, no Uruguai. Como resposta, os blancos se aproximaram do Paraguai para obter apoio contra a situação de dependência em relação ao Brasil e à Argentina.
  • Solano López se aproximou de Urquiza (de Entre Ríos), opositor de Mitre, visando a colocar o Paraguai na posição de um terceiro polo de poder regional.
  • Como reação à tentativa de aliança do Uruguai com o Paraguai, a Argentina tratou de se aproximar do Brasil, propondo um eixo de cooperação, em virtude dos interesses comuns a ambas as nações:
  1. convergência ideológica: Brasil e Argentina eram Estados centralizados e sob governos liberais.
  2. viam com desconfiança o governo blanco no Uruguai.
  3. tinham questões de fronteiras para tratar com o Paraguai.
  • O Brasil, agora nas mãos do Partido Liberal, não tinha uma política concreta para o Prata e passou a atuar de forma reativa, em defesa dos interesses gaúchos no Uruguai, que tinham suas atividades pecuaristas prejudicadas naquele país. 
  • 1864: Brasil interveio no Uruguai, com o apoio da Argentina. Reação: Paraguai invade o Mato Grosso (1864) e Corrientes (1865).
  • 1865: formação da Tríplice Aliança – Brasil, Argentina e Uruguai, apesar da dura oposição do Partido Conservador (BR), que desaconselhava o aumento das fronteiras brasileiro-argentinas (pois o tratado reconhecia o Chaco paraguaio como sendo argentino, até a fronteira com o MT).
  • 1868: Partido Conservador chega ao poder no Brasil, e, na Argentina, assume Domingo Sarmiento, contrário à cooperação com o Império.
  • O Plano de Solano López: uma guerra-relâmpago, iniciando pelo norte, onde contariam com o apoio da população de Corrientes, que viria o Paraguai como libertador, e se juntariam às suas tropas, migrando para Buenos Aires para derrubar Mitre. Invadiriam o RS, para chegar ao Uruguai, onde contariam com o apoio dos blancos para vencer as tropas brasileiras. Com resultados, o Paraguai forçaria o Império brasileiro a assinar a paz, reconhecendo-o como novo ator regional e, graças à “libertação” do Uruguai, teriam o porto de Montevideu como ponto de escoamento da produção paraguaia.
  • Fracassos da ofensiva paraguaia:
  1. os federalistas argentinos não se uniram às tropas paraguaias.
  2. Batalha Naval de Riachuelo: vitória brasileira no arroio Riachuelo (Corrientes, AR), consolidando o bloqueio naval do Paraguai.
  3. coronel Estigarribia invade Uruguaiana e acaba derrotado em 1865 pelas tropas brasileiras.
  • 1866: tropas aliadas, sob o comando de Mitre, invadem o Paraguai, através do Passo da Pátria, com o objetivo de tomar a fortaleza de Humaitá, que controlava a navegação no rio Paraguai. Através daí, as tropas aliadas subiriam, via fluvial, até Assunção.
  • Dificuldades: o Exército aliado não conhecia o território paraguaio, sua população, seus recursos militares etc, devido ao isolamento por que havia passado o país. O território de Passo da Pátria era bastante desfavorável para os aliados, permitindo que López construísse uma linha defensiva, levando a uma guerra de posições até 1867.
  • 1868 – Queda de Humaitá: Mitre retirou-se para Buenos Aires, para assumir a presidência, e o marquês de Caxias acabou liderando as forças aliadas. Caxias cercou Humaitá e ordenou que a esquadra ultrapassasse a fortaleza, rumo a Assunção. Os paraguaios, vindo-se cercados, evacuaram a região, e não houve enfrentamento.

  • Caxias propôs a D. Pedro II que se firmasse a paz com o Paraguai, porém o Imperador rejeitou a proposta, por desconfiar das intenções futuras de López.
  • Também os EUA e algumas repúblicas do Pacífico ofereceram-se como mediadores do conflito, mas novamente D. Pedro II refutou tais propostas, objetivando a deposição e prisão de Solano López, como forma de garantir a paz futura.
  • O império brasileiro temia que uma paz acordada significasse o fortalecimento do Paraguai e, mais ainda, uma nova forma de os países vizinhos lidarem com o Brasil: através da força, o que poderia desestabilizar o Império.
  • Estratégia final de Caxias: cruzar o rio Paraguai e marchar sobre o Chaco, através de uma trilha improvisada com troncos de palmeiras, para atacar os paraguaios em Lomas Valentinas.

Luís Alves de Lima e Silva, duque de Caxias

  • Para cercar os inimigos em Lomas Valentinas, em 1868, foram necessárias forças de reserva (tropa argentina + brigada brasileira + tropa uruguaia), devido às milhares de perdas sofridas pelo exército aliado.
  • Solano López foge para o interior do Paraguai e reorganiza suas forças militares, recrutando toda a população, incluindo crianças, idosos, etc.
  • 1869: os brasileiros ocupam Assunção, que estava deserta, e Caxias, já debilitado, declara a guerra terminada, retirando-se do Paraguai, o que obrigou D. Pedro II a nomear o Conde d’Eu como novo comandante das tropas. O conde contou com o apoio do ministro de Negócios Estrangeiros no Paraguai, José da Silva Paranhos, e dos generais Osório e Câmara.

Conde d’Eu e demais aliados, 1870

  • 1870: general Câmara alcança e mata Solano López.
  • Por que a guerra se estendeu por cinco anos, mesmo sendo clara a superioridade bélica dos aliados?
  1. pouca iniciativa dos militares brasileiros;
  2. falta de conhecimento geográfico sobre o Paraguai;
  3. clima hostil;
  4. bravura dos soldados paraguaios;
  5. dificuldades logísticas;
  6. despreparo, em termos de organização das tropas, no momento em que a guerra estourou;
  7. desconfiança dos brasileiros com os argentinos e vice-versa, o que impediu que fosse utilizada toda a superioridade naval brasileira em operações arriscadas;
  8. o comanda superior da marinha brasileira era formado por velhos burocratas do Império, que nunca haviam estado em campo de batalha, e que estavam desatualizados sobre as novas tecnologias de guerra;
  9. erros táticos na coordenação das forças dos três países aliados.
  • Pós-guerra: o Brasil queria manter o Paraguai independente e impedir que a Argentina tomasse o Chaco, conforme constava no tratado da Tríplice Aliança. A Argentina de Sarmiento veio com uma política de que a vitória militar não concedia aos vencedores direitos sobre as fronteiras com o Paraguai.
  • 1872: Império assina um tratado de paz com o Paraguai, bilateralmente, definindo a fronteira comum como até o rio Apa (intenção do Brasil antes da guerra). Mitre é enviado em missão diplomática ao Brasil para tentar fazer cumprir as fronteiras propostas no Tratado da Tríplice Aliança, mas fracassa.
  • 1875: Argentina assina o Tratado Sosa-Tejedor, firmando a paz e limites com o Paraguai, independentemente do Império, porém os paraguaios não assinam, devido à pressão brasileira.
  • 1876: assinados os acordos de paz entre Argentina e Paraguai.
  • 1878: a questão das fronteiras entre Argentina e Paraguai foi arbitrada pelo presidente norte-americano, que decidiu favoravelmente ao Paraguai. Logo, a Argentina não se apossou do Chaco.
  • Resultados da guerra:
  1. PARAGUAI: destruição do Estado existente, perda de territórios vizinhos e ruína da economia paraguaia, de modo que mesmo décadas depois, não conseguiu se desenvolver da mesma forma que os vizinhos. Perdas na guerra: até 69% da população, a maioria devido a doenças, fome e exaustão física.
  2. BRASIL:a guerra expôs a fragilidade militar-estrutural do Império, devido à escravidão, principalmente, mas saiu vitorioso militarmente e fortaleceu sua hegemonia até 1875. Reflexos internos: desequilíbrio orçamentário e no Tesouro brasileiro, além da forte dissociação entre Exército e monarquia, devido ao sentimento de identidade que se construiu durante a guerra. Perdas na guerra: 50 mil homens, devido a doenças e ao rigor do clima.

    Imperador D. Pedro II em visita ao RS, 1865.

  3. ARGENTINA:passou por inúmeras rebeliões federalistas contra o governo nacional, pelo descontentamento com a guerra; economicamente foi beneficiada, pois abasteceu as tropas brasileiras com produtos (principalmente carne e  cereais) oriundos de Buenos Aires, mas também houve sangria do Tesouro nacional. A guerra contribuiu para a consolidação do Estado nacional argentino e para dinamizar sua economia. Perdas na guerra: 30 mil homens.

    Soldados argentinos acampados em Tuiuti

  4. URUGUAI:sofreu impactos menores. Perdas na guerra: 5.000 soldados.

    Coronel uruguaio León de Palleja é retirado morto do campo de batalha

  • Alterações no plano regional: a guerra de certa forma substituiu a histórica rivalidade entre Argentina e Brasil pela cooperação entre os dois grandes países, uma aliança estratégica duradoura, embora as desconfianças entre os lados continuem até hoje. 

O Primeiro Reinado e as Repúblicas do Pacífico (1822-1831)

Resumo do capítulo 1 do livro O Império e as Repúblicas do Pacífico – As Relações do Brasil com Chile, Bolívia, Peru, Equador e Colômbia, de Luís Cláudio Villafañe Gomes Santos – Política Externa Brasileira I – Prof. André Luis Reis da Silva

A Revolução Americana

  • A guerra de libertação da América Espanhola começou de fato em 1817, quando San Martín nomeia, após campanha no Chile, O’ Higgins como novo governante chileno.
  • San Martín queria libertar o Peru, centro da resistência espanhola, porém não conseguiu por terra (através da Bolívia) e acabou passando a tarefa para Simón Bolívar, que em 1819 organizara governos provisórios em Nova Granada e na Venezuela.
  • 1825: Bolívar liberta o Peru, na batalha de Ayacucho.
  • 1826: espanhois retiram-se pelo porto de Callao, no Peru.
  • Por que o Brasil conseguiu manter sua integridade territorial, enquanto que a América hispânica não, apesar dos esforços de Bolívar? Fatores principais:
  1. a coesão da elite portuguesa (em termos ideológicos e de treinamento, segundo J.M. de Carvalho), na época da independência brasileira, o que não ocorria nas repúblicas hispano-americanas.
  2. a escravidão negra (como aponta Luiz Felipe de Alencastro), por homogeneizar as elites regionais em torno do tráfico internacional de escravos, o que assegurava à burocracia imperial o poder de negociar com os ingleses, contendo suas pressões pelo fim do escravismo; e, ao mesmo tempo, mantendo a integridade política e administrativa do Brasil, por atender aos interesses internos (escravocratas).
  • Autonomia possível: apesar de dependência econômica com a Inglaterra, o governo imperial resistiu em renovar os tratados de 1827 e acabou rompendo com os ingleses em 1863. 
  • As relações com os países vizinhos nas primeiras décadas da independência, em termos comerciais, eram pouco expressivas, exceto na região do Prata. Havia antagonismos (Império x repúblicas, manutenção do status quo x integração etc).
  • A preocupação do Império nesse imediato período pós-1822 era com a navegação na Bacia do Prata (para comunicação com Mato Grosso) e o comércio nessa região (importante para setores luso-brasileiros e pecuaristas do Sul).
  • A prioridade do Império era a região da Cisplatina, tanto que levou isso a guerra, enquanto que a expansão dos limites para oeste (questão de Chiquitos) foi descartada. 

Uma Possibilidade de Conflito

  • Após a batalha de Ayacucho (1824), as tropas bolivarianas dirigem-se para a Bolívia, sob o comando do general Sucre.
  • O governador da província boliviana de Chiquitos, Sebastián Ramos, propôs ao governo de Mato Grosso que sua província fosse colocada sob a proteção do Império até que a coroa espanhola reconquistasse o território.
  • A proposta foi aceita pelo governo provisório de Mato Grosso, pois este via com bons olhos a extensão das fronteiras brasileiras, já que com isso sua província deixaria de ser periferia.
  • A província de MT passava por um processo de estagnação econômica, em virtude do declínio da mineração na região e Vila Bela (ou Mato Grosso), sede da província, temia a perda do status de capital para Cuiabá, o que acentuaria o declínio da cidade, da qual muitos residentes faziam parte do governo provisório.
  • Ramos envia tropas a Chiquitos para consolidar a adesão, enquanto que, do lado boliviano, Sucre negocia o apoio das tropas argentinas para um eventual ataque ao Império. Bolívar, entretanto, não aderiu ao movimento e orientou Sucre a ser cauteloso, por temer uma reação da Santa Aliança.
  • Alguns dias depois as autoridades mato-grossenses retiram as tropas de Chiquitos, por razões ainda desconhecidas. De qualquer forma, meses depois o governo imperial, ao tomar conhecimento do incidente, desautorizou a anexação da província pelo governo do Mato Grosso.
  • Mato Grosso era região periférica na época, e estagnada economicamente, enquanto que o Império ainda articulava pelo reconhecimento de sua independência e preocupava-se com a ameça de guerra no Prata. Portanto, não havia como aquela província conduzir o governo do Rio de Janeiro a uma guerra de tamanha proporção, o que já havia sido interpretado por Bolívar.
  • Mesmo informados de que o Império não tinha pretensões de anexar Chiquitos, disseminaram-se hostilidades nas repúblicas hispânicas, principalmente por parte dos argentinos, com relação ao Brasil.
  • A atitude da província de Mato Grosso quase acabou por catalisar a formação da tão temida coalizão anti-brasileira.

Província de Chiquitos na época (à esquerda, em bege) e hoje (à direita, em vermelho).

A Guerra da Cisplatina e a Tentativa de Formação de uma Aliança Anti-Brasileira

  • Reconhecimento da independência brasileira por Portugal: 29 de agosto de 1825, sob a mediação inglesa.
  • Província Cisplatina: incorporada por D. João VI em 1816, acabou constituindo as províncias brasileiras na época da independência, graças ao Barão de Laguna.
  • Em 1823, Buenos Aires inicia os protestos sobre a anexação da província, exigindo sua entrega às Províncias Unidas do Rio da Prata.
  • Missão Alvear-Iriarte (1824): missão argentina rumo a Londres e a Washington, tentando apoio desses países a fim de que o Brasil mantivesse seus limites e liberasse a Província Cisplatina.
  • Missão Alvarez Thomaz (1824): missão argentina rumo ao Peru e ao Chile, buscando apoio na questão cisplatina. Pretendiam falar com Bolívar, mas não o encontraram.
  • Missão Alvear-Vélez (1825): missão argentina rumo à Bolívia, para tratar da Cisplatina. Argumentou que o incidente de Chiquitos dava respaldo ao Peru e à Grã-Colômbia para agirem contra o Império brasileiro, que “insultava o Exército Libertador”. Bolívar não conhecia a posição do governo colombiano e tampouco a da Inglaterra, por isso enviou carta ao presidente da Grã-Colômbia, Santander, o qual o aconselhou a não se envolver em tal conflito, justamente pelo não-conhecimento da posição inglesa.
  • 1826: chanceler inglês envia carta a Bolívar, opondo-se à guerra contra o Brasil. Bolívar, assim, recomenda a Sucre que fosse prudente e delicado com a questão, por Bogotá e Londres estarem em desacordo com tal intervenção.
  • Diplomacia argentina tenta apoio do Peru (1826), porém o governo peruano se opõe à questão. Tentam, ainda, apoio do Chile, cujo congresso não aceitou uma intervenção direta, no entanto venderam 3 navios de guerra à Argentina.
  • Os governos do Chile, Grã-Colômbia, Peru e Bolívia simpatizavam com a causa argentina, mas não viam o Império brasileiro como uma ameaça iminente, a ponto de justificar o envolvimento militar. Ademais, havia a oposição inglesa, que acabaria por tornar a possível guerra penosa demais para as elites hispano-americanas. Esses governos valorizavam o apoio britânico, pois ela era a potência naval da época, única que poderia impedir que a Santa Aliança intervisse na América do Sul, mantendo assim o status quo.
  • A irrupção de um conflito no Prata prejudicaria seriamente o comércio britânico na região e poderia criar um antagonismo ideológico entre a Europa e a América, o que só não acontecia porque os Bragança conduziam a monarquia no Brasil com relativa estabilidade. A Inglaterra, portanto, não tinha interesse algum em desestabilizar o Império.

 O Congresso do Panamá

  • Simón Bolívar queria unificar a América hispânica através de uma federação que trataria da defesa e da política externa comum dos novos Estados, resolvendo divergências entre eles e opondo-se ao Concerto Europeu. Para isso enviou, em 1821, agentes ao México, ao Chile e à Argentina, negociando tratados bilaterais de aliança, com vistas a organizar o Congresso.
  • Foram convidados também Colômbia, México, América Central, Províncias Unidas e Chile. A Colômbia encarregou-se de convidar o Brasil, a Inglaterra, os Estados Unidos, a França e os Países Baixos.
  • O Brasil era visto com desconfiança pelos vizinhos, por suas instituições monárquicas e sua origem portuguesa. Essa desconfiança aumentou com o Incidente de Chiquitos (1825) e pelas suspeitas de que D. Pedro I fosse favorável a uma intervenção da Santa Aliança, visando à restauração colonial.
  • A relação entre o Império e a Santa Aliança não se concretizou, pois não houve qualquer auxílio das monarquias europeias ao Brasil durante a Guerra da Cisplatina. Ademais, a Inglaterra, potência naval da época, era contra uma possível restauração nas Américas por parte da Santa Aliança, porque a volta do pacto colonial (com Espanha ou Portugal) prejudicaria em muito os interesses coloniais ingleses.
  • Congresso do Panamá (1826): compareceram Grã-Colômbia, América Central, Peru e México, os quais assinaram o Tratado de União e Confederação Perpétua, que acabou só sendo ratificado pela Colômbia. O Brasil, na verdade, não tinha intenção de participar, mas oficialmente designou um representante, que acabou não chegando a tempo no Panamá.  O Congresso acabou fracassando (em termos práticos, embora tenha plantado o ideário integracionista), pois não havia evidências de que o Brasil fosse de fato uma ameaça às repúblicas hispano-americanas e o projeto de confederação não prosperou, já que a maioria dos países não ratificou o tratado.
  • Os diplomatas brasileiros, especialmente Duarte da Ponte Ribeiro, constataram, ao contrário do que se imaginava ser uma tendência na época, que muitas repúblicas hispano-americanas tinham interesse em adotar instituições monárquicas. O Peru, por exemplo, cujas elites tinham algum interesse em abandonar a república e adotar uma monarquia, na qual possivelmente Bolívar poderia ocupar o trono. Esse desejo porém fracassou e o Brasil continuou como a única monarquia americana.

O Estabelecimento de Relações Diplomáticas

  • A imagem do Império junto às repúblicas vizinhas nos primeiros anos das independências era, sem dúvida, bastante negativa, muito por causa da questão de Chiquitos, da Guerra da Cisplatina e das desconfianças da relação Brasil-Santa Aliança.
  • O Chile e as Províncias Unidas mostraram-se pouco interessados na criação de um confederação, proposta por Bolívar.
  • Bolívar havia deixado Sucre na presidência da Bolívia, um outro governo de sua direta influência no Peru e tinha nas mãos a presidência da Grã-Colômbia. Queria, assim, integrar essas regiões na chamada Federação Andina.
  • 1826: o Peru envia Domingos Cáceres ao Brasil, encarregado de investigar a aproximação do Império com qualquer conspiração contra as repúblicas pacíficas e discutir os limites Peru-Brasil. O governo imperial, entretanto, não quis discutir o assunto.
  • 1827: a Grã-Colômbia de Bolívar envia Leandro Palacios como representante junto à Corte, para discutir os limites Colômbia-Brasil. O assunto mais uma vez não foi abordado, porque o Império alegou falta de dados necessários para tal negociação.
  • 1828: golpe no Peru derrubou o governo bolivariano, criando tensões entre esse país e a Grã-Colômbia.
  • 1828: o novo governo peruano invade a Bolívia e derruba Sucre da presidência. Após a deposição, assina o Tratado de Piquiza, com o novo governo boliviano (do general Urdininea), através do qual ambos os países se comprometem a não estabelecer relações com o Brasil até o fim da Guerra Cisplatina.
  • 1828: Bolívar tenta se aproximar do Brasil, para obter apoio na sua disputa com o Peru, e porque queria que o Brasil o ajudasse a obter o reconhecimento da independência da Grã-Colômbia com a Espanha.
  • 1829: Duarte da Ponte Ribeiro é enviado representante do Império brasileiro no Peru e Luiz de Sousa Dias na Colômbia. As instruções era que os diplomatas brasileiros tentassem algum tipo de tratado comercial com esses países, porém Ponte Ribeiro considerou inútil qualquer tratado de comércio com os peruanos naquele momento; e, Sousa Dias, por sua vez, constatou que a Grã-Colômbia estava demais fragmentada para que se pudesse negociar e previa uma iminente secessão naquele território.
  • Peru e Colômbia acabam entrando em guerra de 1828 a 29, o que resultou na independência do Equador. Peruanos e bolivarianos disputavam principalmente a região de Guaiaquil, importante porto do Pacífico e região produtora de madeiras de construção.

O Parlamento e a Diplomacia de D. Pedro I

  • O Parlamento brasileiro contestava as ações diplomáticas de D. Pedro I, era um dos principais pontos de atrito.
  • O imperador tinha o poder de ratificar tratados internacionais e de declarar guerra/paz, enquanto que o parlamento, além de ser responsável pela aprovação do orçamento de diversas pastas, influenciava (ou tentava) na condução da política externa, apresentando os interesses dos grupos dominantes.
  • O reconhecimento da independência brasileira se deu em troca de uma série de tratados com vantagens comerciais, coisa  que o Parlamento desaprovava.
  • Havia claramente duas correntes de visão: a própria bragantina, representada em D. Pedro I, que tentava manter relações com as cortes europeias sob a ótica de um sangue azul; e a do Parlamento, que possuía um sentimento anti-tratados, alegando que estes eram desnecessários ao Estado.
  • O sistema de tratados só cessou com as Regências e depois na República.

A Consolidação Interna e a Ascendência Inglesa (1831-1850)

Resumo do capítulo II do livro Relações Exteriores do Brasil I (1808-1930): A Política Externa do Sistema Agroexportador, de José Luiz Werneck da Silva e Williams Gonçalves – Política Externa Brasileira I – Prof. André Luis Reis da Silva

1831 e o Problema Paraguaio

  • Herança da política externa bragantina: dependência em relação à Inglaterra e animosidade na região platina (Missão Santo Amaro).
  • O Império brasileiro era favorável à manutenção do status quo em países vizinhos, pois acreditava ser mais fácil impedir uma insurgência contra o Brasil estando os países hispano-platinos divididos, não integrados em algum tipo de federação.
  • Acreditava-se na época que era importante dominar a foz dos grandes rios, mas o Império não tinha posse sobre a foz dos rios Uruguai, Paraguai e Paraná, por estarem fora de seu território, apenas detinha suas nascentes. As nascentes destes três grandes rios eram importantes comunicantes entre o RJ e o oeste do RS, PR e MT, o que significava acesso às fronteiras ocidentais brasileiras.
  • Havia uma preocupação, a partir do momento em que se passou a usar a navios a vapor para navegação fluvial, de se manter livre a passagem nos três grandes rios da fronteira oeste brasileira. Para garantir esse acesso era preciso estabilidade na região, ou seja, que os vizinhos latino-platinos se mantivessem territorial e politicamente separados.
  • D. Pedro II declarou que não aceitaria estipulações de tratados com países estrangeiros mais fortes e que não fossem limítrofes, para evitar compromissos adversos aos interesses do Império brasileiro.
  • Todavia, na metade do século XIX realizou-se a chamada diplomacia do patacão, com uma série de intervenções na região do Rio da Prata (1851-76), após resolvidas algumas questões internas, muito por influência do Barão de Mauá.
  • A política platina do Império ia ao encontro da política inglesa, em virtude dos interesses econômicos da Inglaterra na América hispano-platina. Estes se preocupavam com a formação de uma coalizão anti-imperial que criaria dificuldades para o comércio na região, não só para o Brasil, mas também os ingleses sairiam prejudicados.
  • PARAGUAI: desenvolveu-se economicamente através de uma base rural, com agricultura e pecuária de abastecimento e uma “indústria natural”, ou seja, não estava inserido no capitalismo industrial e livre-cambista da época. Diante disso, alguns historiadores como Chiavenatto e Pomer, consideram a Guerra do Paraguai fruto de uma aliança imperial britânico-brasileira para tirar o Paraguai do isolamento e inseri-los no mercado internacional.
  • Tomaremos aqui como referência o historiador paraguaio Efraim Cardozo, por não estar vinculado a objetivos ideológico-xenófobos da ditadura de Stroessner (1954-89).
  • Cardozo apresenta uma versão sobre o isolamento geográfico paraguaio, que teria se dado por desavenças entre cabildos de Buenos Aires e demais províncias argentinas com o cabildo de Asunción, e não por conta da política imperial brasileira.
  • 1853: Carlos Antonio López consegue o reconhecimento da independência do Paraguai com a Inglaterra, França, EUA e Piemonte-Sardenha, em troca de livre navegação no Rio Paraguai. Lopez dava extrema importância à relação diplomática com o Império brasileiro, para contrabalancear com os argentinos, argumentando que não seria possível para o Paraguai barganhar apenas com sua mediterraneidade.
  • Solano López: seguiu com a política de modernização do Paraguai, iniciada pelo pai, Carlos López, porém abriu mais o país, através do porto de Asunción, além de militarizar a República. Entretanto, sofria com o isolamento geográfico, pelas dificuldades de navegação no Rio Paraná, o que limitação sua atuação no cenário internacional.
  • Inglaterra: apesar da Questão Christie (1862-1865), que provocou a ruptura das relações diplomáticas com o Brasil, os portugueses mediaram a volta da parceria entre os impérios britânico e brasileiro, o que viria a favorecer a Inglaterra após a vitória da Tríplice Aliança na Guerra do Paraguai. Os ingleses ofereceram empréstimos aos brasileiros, facilmente aceito por uma nação que estava prestes a entrar em guerra.

As Regências e o Retraimento Diplomático

  • Duas questões que marcaram a política externa do Império Brasileiro, as quais eram herança bragantina: 1. relações com o Império Britânico e 2. relações com os países platinos.
  • Pode-se dividir o período em duas fases:
  1. 1830-50: tomando como marco a abdicação de D. Pedro I.
  2. 1850-70: marcada por acontecimentos como a lei de extinção do tráfico negreiro (1850), a promulgação do Código Comercial (1850), a Lei de Terras (1850), o fim da Revolta Praieira (1850) e as primeiras intervenções no Prata (1851, contra Oribe no Uruguai e Rosas na Argentina).
  • Por quê as intervenções no Prata só aconteceram em 1851? Porque no Primeiro Reinado as preocupação eram outras, principalmente em se manter a integridade territorial e atrelar a economia brasileira às práticas livre-cambistas inglesas. Chegando ao final desse período, procurou-se substituir o livre-cambismo pelo protecionismo.
  • A Inglaterra na metade do século XIX voltava-se mais para Ásia (China e Índia) e deixou a América Latina em segundo plano, principalmente na Foz do Prata, deixando uma oportunidade para o Império Brasileiro atuar.
  • Neutralidade paciente (1828-50): foi como se denominou o período em que o Império não interveio no Prata, porém ficava atento para que a região não se integrasse, a fim de melhor dominá-la. Não intervinha diretamente por tentar manter a integridade do Império e a própria monarquia, que enfrentava resistência de movimentos como a Sabinada (1837-38)e a Guerra dos Farrapos (1835-45). Esse período foi também marcado pela domínio da Província do Rio de Janeiro, onde fica o Governo Central e o qual interveio nas províncias rebeldes sempre que necessário, porém apenas internamente.
  • No período de não-intervenção no Prata, o Império passou o balde para a Inglaterra e a França, que adotavam políticas semelhantes a ele, quais sejam: dividir para dominar (impedir coalizões Uruguai-Argentina-Paraguai) e apoiar elites cosmopolitas dos grandes portos (Buenos Aires e Montevideu). 
  • Convenção Mackau-Araña (1840): franceses põem fim ao conflito com Rosas, quando bloquearam o porto de Buenos Aires e ocuparam a Ilha de Martim Garcia na Foz do Prata, além de terem se aliado aos federalistas argentinos e aos colorados uruguaios. Nessa convenção, a França compromete-se a se retirar da região e Rosas promete não intervir na Banda Oriental do Uruguai. 
  • O Império Brasileiro propôs à França uma aliança contra Rosas (Missão Abrantes, 1844), que desrespeitava a Convenção de Paz de 1828 e a de 1840, porém franceses e ingleses firmaram uma paz com Rosas em 1850. Fracassada essa missão, tentaram uma aliança com Rosas contra o uruguaio Rivera e os farroupilhas da República Riograndense, porém isso também não teve sucesso, em virtude de o argentino exigir a participação de Oribe. 
  • A tentativa de aliança do Império Brasileiro com Rosas contra os gaúchos foi uma clara manifestação de que a política externa do período priorizava a questão interna, manter a integridade, nem que para isso fosse preciso se aliar a um possível inimigo.
  • Com relação ao Paraguai, adotou-se uma política de mantê-lo isolado e protegido contra a Argentina. 
  • 1843: Império Brasileiro reconhece a independência do Paraguai (1842) – Missão de José Antonio Pimenta Bueno.
  • 1850: Império assina um tratado de aliança com o Paraguai – Missão de Pedro de Alcântara Bellegarde.

 As Relações Brasil-Grã-Bretanha e o Tráfico

  • Por que o Império ainda precisava dos países norte-atlânticos (França e Inglaterra) e de uma aproximação com Rosas? Primeiramente para cumprir os tratados livre-cambistas assinados com a Inglaterra nos anos 1820, cujas vantagens também foram oferecidas à França. Esses tratados representavam uma nova forma de exploração, não mais através do monopólio mercantilista, mas através de uma subordinação da periferia atrasada primário-exportadora ao centro avançado e industrializado.
  • A Inglaterra também firmara um tratado sobre o fim do tráfico negreiro pelo Brasil, mas não exigia a rigor o seu cumprimento, em virtude de algumas forças internas do Império Britânico ainda serem escravocratas.
  •  Forças divergentes na Grã-Bretanha dos anos 1840:
  1. Black England: fruto do avanço da Revolução Industrial, da urbanização e detentora de poder econômico. Favorável ao livre-cambismo, queria exportar manufaturados e importar produtos primários. Foi o projeto vitorioso.
  2. Green England: o setor rural, tradicional, das grandes propriedades e não-aburguesado e detentora de poder político que vinha da Idade Média. Favorável ao protecionismo principalmente para a produção de alimentos.
  • O cerco ao tráfico negreiro começa a partir de 1842, quando o Império Brasileiro se recusa a renovar os tratados com os ingleses, o que coincidiu com o aumento do poder político da Black England, disposta a colocar seus produtos no mercado internacional.
  • Na Inglaterra os industriais revogaram-se as leis protecionistas, aboliram as Corn Laws e as Navigation Laws e impuseram o livre-cambismo. Entretanto no Brasil, tendia-se ao protecionismo → Tarifas Alfandegárias Alves Branco (1844), visando a proteger a insipiente produção nacional, a promover o entesouramento fiscal, estabelecendo taxas em função da necessidade da economia imperial brasileira de importar/exportar. Esse foi um dos motivos que levou a Black England a atingir o cerne da economia imperial brasileira: o escravismo.
  • O aumento do tráfico negreiro, após 1845, no entanto, aumentou surpreendentemente, graças aos traficantes de escravos, que financiavam inclusive a compra, oferecendo empréstimos aos fazendeiros e penhorando as colheitas ou porções de terra. Chegaram a deter 60% do meio circulante à disposição, o que os tornava um dos grupos mais poderosos do Império.
  • A necessidade de se acabar com o tráfico então encontrou dois fortes motivos: externamente, pela pressão inglesa e internamente, em defesa dos interesses nacionais de setores latifundiários, que estavam se tornando muito dependentes dos traficantes de escravos. 
  • 1850: fim do tráfico negreiro – Lei Eusébio de Queiroz.
  • As questões internas estavam praticamente solucionadas: o Império conseguiu conter os sabinos, os balaios, os praieiros e fizera um acordo de paz com os farroupilhas, oferecendo a estes últimos proteção sobre o charque rio-grandense, através da criação da taxa alfandegária de 25% sobre o charque importado. A estratégia era agradar os rio-grandenses para contar com o seu apoio na iminente guerra contra Rosas e seus aliados blancos

Os Bragança, a Independência e o Sistema de Viena (1808-1831)

Resumo do capítulo I do livro Relações Exteriores do Brasil I (1808-1930): A Política Externa do Sistema Agroexportador, de José Luiz Werneck da Silva e Williams Gonçalves – Política Externa Brasileira I – Prof. André Luis Reis da Silva

A Diplomacia dos Bragança e a Independência (1808-1822)

  • O mercantilismo português entrou em crise com a guerras napoleônicas, colocando França e Inglaterra como os principais poderes do início do séc. XIX. Os franceses, liderados por Napoleão, que impusera o Bloqueio Continental aos países europeus, através do Decreto de Berlim (1806), e ameaçava invadir Portugal; e os ingleses, que se afirmavam como maior potência marítima da época, detentores de um vasto império colonial de proporções globais.
  • Portugal precisava decidir para que lado iria: se se aliava a Napoleão, como fizeram os espanhois, ou se pendia para a salvaguarda dos ingleses, seu maior parceiro comercial da época.
  • Prós da associação com a Inglaterra: a família real portuguesa não precisaria se submeter a Napoleão e poderia, ao transferir a corte para o Brasil, transformar o imenso território da colônia em sede de um poderoso império.
  • Contras da associação com a Inglaterra: aumento da dependência com os ingleses.
  • Prós da associação com a França: as tropas napoleônicas eram superiores às britânicas, logo, os britânicos não poderiam defender os portugueses.
  • Contras da associação com a França: Portugal corria o risco de perder todo o seu império, pois não possuía capacidades necessárias para defender seu território e suas colônias.
  • O que de fato aconteceu? Portugal não conseguiu transformar o Brasil em sede do seu império, pois, ao elevar o país a Reino Unido de Portugal e dos Algarves (1815), acabou facilitando a independência, que aconteceria alguns anos depois. Ainda, o território português tampouco foi tomado pelos franceses, como aconteceu com a França, em virtude da mobilização do clero e de ajuda militar inglesa, que foram vitoriosos em expulsar os franceses do reino.
  • 1807: D. João põe em prática o plano de transferência da Corte para o Brasil, escoltados pela marinha britânica.
  • 1808: chegada da família real no Brasil e abertura dos portos às nações amigas (Inglaterra), como retribuição ao apoio prestado.
  • 1809: D. João revoga todos os tratados assinados com a França e invade a Guiana Francesa, considerando-a parte do império português, conforme o Tratado de Utrecht (1713). O território foi devolvido à França somente em 1817.
  • 1810: assinatura dos chamados Tratados Desiguais, que concedia privilégios alfandegários aos ingleses (15%), enquanto que Portugal pagava 16% e as demais nações 24%. O porto franco da ilha de Santa Catarina (atual Florianópolis) passa à tutela inglesa.
  • Questão do Prata: área estratégica para o comércio colonial com toda a região, especialmente a Colônia de Sacramento, disputada por Portugal, Espanha e Buenos Aires (que buscava independência).
  • D. Carlota Joaquina de Bourbon: filha do rei espanhol Carlos IV, irmã de Fernando VII (herdeiro do trono) e ex-esposa de D. João, reivindicava possessões na América hispânica, após a invasão de José Bonaparte, que destituiu a coroa espanhola. Contava com a simpatia de certas elites portenhas, porém setores pró-britânicos da corte joanina eram contra esse projeto, por almejarem anexar a região do Prata, além dos próprios ingleses serem também contrários por preferirem que a região se mantivesse fragmentada, facilitando assim o comércio.
  • 1810: Buenos Aires declara independência da Espanha e incentivam a emancipação do atual Uruguai.
  • 1811: D. João envia tropas à Banda Oriental para assegurar as fronteiras, porém as agitações persistem até 1817.
  • 1821: as tropas joaninas vencem os rebeldes e a região – agora denominada Estado Cisplatino – passa a pertencer ao Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves.

A Política Externa do Primeiro Reinado (1822-1831)

  • 1822: Independência do Brasil, totalmente arquitetada pelos próprios Braganças (do Brasil e de Portugal) e com o aval da Inglaterra. Não houve participação popular, guerra, e tampouco significou um ruptura com os portugueses. A independência pode ser vista como um acordo com a metrópole e uma interiorização da metrópole, mantendo todas as estruturas antes existentes, embora o Brasil passasse a ser juridicamente um Estado independente.
  • Em termos de política externa, 1822 nada significou para o Brasil, pois até a abdicação de D. Pedro I (1831) se manteve uma diretriz similar a que vinha sendo adotada pelos Bragança, qual seja, atender os interesses destes, fossem ultramarinos, fossem transoceânicos.
  • O Estado Monárquico Brasileiro herda, por consequência, duas questões da política portuguesa: a dependência em relação à Inglaterra (elemento de subordinação) e as questões platinas com vistas a um expansionismo (elemento de relativa autonomia).
  • 1823: primeira Assembleia Constituinte da História do Brasil, com a participação de uruguaios, representando a Cisplatina.
  • 1825: o diplomata inglês Sir Charles Stuart intermedeia um acordo entre os Bragança de Portugal e os do Brasil para que D. João VI reconheça D. Pedro I como Imperador do Brasil. Nas negociações também foram renovados os tratados livre-cambistas com a Inglaterra e Portugal comprometeu-se a acabar com o tráfico negreiro.
  • Quais os interesses da Inglaterra ao dar seu aval à independência brasileira? Além dos acordos feitos em 1825, exigiram que o Brasil assumisse uma dívida que Portugal tinha contraído com banqueiros ingleses, em 1823, no valor de 2 milhões de libras esterlinas, valor que acabaria sendo o preço pago pelo reconhecimento da independência.
  • D. Pedro I herda uma soberania vendida (com empréstimos britânicos), tratados livre-cambistas feitos com os ingleses e o compromisso de extinguir o tráfico negreiro.
  • Província Cisplatina: uruguaios não queriam estar subordinados nem ao Brasil nem a Buenos Aires, porém com o exílio de Artigas (principal incitador pela independência uruguaia), seus objetivos foram adiados.
  • A elite do Brasil independente era luso-brasileira, estava relativamente coesa e desvinculada das demais latino-americanas.
  • 1825: Argentina (na época, Províncias Unidas do Rio da Prata) anexa a Província Cisplatina → Guerra da Cisplatina. Inglaterra se posiciona como mediadora do conflito, pois queria um ponto de apoio na foz do Prata para 1) penetrar pelos rios platinos, e 2) ter um ponto de escala na rota para a Índia, ou seja, estava preocupada em garantir rotas marítimo-comerciais.
  • 1828: Convenção Preliminar de Paz sobre a Guerra da Cisplatina.
  • Missão Santo Amaro (1828): ao abdicar do trono em 1826, D. Pedro I desejava tornar sua filha, Maria da Glória em rainha de Portugal, porém D. Miguel I (seu irmão) já havia ocupado o posto. Para tentar obter o apoio da Santa Aliança (formada por absolutistas russos, prussos e austríacos, responsáveis pela expulsão de Bonaparte da França) enviou o Marquês de Santo Amaro à Europa oferecendo em troca vantagens na América Latina. Resultados: a missão fracassou com a queda de Carlos X, na França, enfraquecendo a Santa Aliança e, foi cancelada pelos regentes. Mesmo assim, gerou uma hostilidade por parte dos vizinhos hispano-americanos, que passaram a ver o Brasil como adversário.

Introdução – Relações Exteriores do Brasil (1808-1930)

Resumo da introdução do livro Relações Exteriores do Brasil I (1808-1930): A Política Externa do Sistema Agroexportador, de José Luiz Werneck da Silva e Willians Gonçalves – Política Externa Brasileira I – Prof. André Luis Reis da Silva

As Relações Internacionais

  • A política externa do Brasil Monárquico tem duas faces: dependente (da Inglaterra) e dominante/hegemônica (sobre as questões do Prata). Em alguns momento, como na questão platina, as duas políticas coincidiam.
  • O que é História Diplomática? É a história das relações entre Estados independentes, porém abordando apenas as relações oficiais, entre agentes credenciados pelos governos (diplomatas).
  • O que é História das Relações Internacionais? É, além da história das relações entre Estados, a relação ou influência não apenas interestatal, mas com indivíduos, grupos, instituições, entidades, ligados ou não aos governos.
  • O que é, então, História da Política Externa? É uma explicação sobre que orientação determinado Estado tem a respeito de outros, em certas conjunturas.
  • Quem formula e quem executa a política externa de um determinado governo? Os homens de Estado, interagindo com as forças profundas (condições econômicas, sociais, psicológicas coletivas, psicologia individual dos protagonistas), de acordo com Duroselle e Renouvin. Mas, também, podemos incluir a influência relativa de grupos hegemônicos integrados no pacto social do poder. Não há como todos os blocos integrantes de um governo participarem da política externa, mas eles atuam – em maior ou menor grau, dependendo do assunto – através de lobbies. Deve-se lembrar que nem sempre a política interna é simétrica à externa.
  •  O Estado Imperial Brasileiro não era um típico Estado moderno, capitalista em sua plenitude, pois havia a escravidão, uma economia primária-exportadora. Assim, a política externa do Brasil Monárquico ficava a cargo do Conselho de Estado.
  • Conselho de Estado: órgão consultivo do Poder Moderador, formado pelos Ministros de todas as pastas e por conselheiros de confiança do Imperador, independentemente de posição político-partidária. Os senhores que compunham o Conselho eram especialistas em assuntos diversos (política internacional, negócios estrangeiros etc).

Periodização da Política Externa Brasileira

  • A história das relações internacionais do Brasil conduz a uma política externa orgânica e estruturalmente dependente, mesmo que possa ser conjunturalmente autônoma.
  • O tempo usado na periodização é o tempo longo, das estruturas.
  • 1º MOMENTO: definição do espaço territorial brasileiro, que vai do Tratado de Tordesilhas (1494) à atuação do Barão de Rio Branco como Ministro das REL na República das Oligarquias (1902-1912). Os limites do Brasil foram definidos através do domínio efetivo (utis possidetis), que serviu de base para os tratados coloniais. O espaço fica definido com a anexação do Acre, em 1903.
  • Dependências por que passou o Brasil: mercantilismo ibérico (séc. XV – XVIII), capitalismo industrial liberal-concorrencial inglês (séc. XVIII – XIX), imperialismo inglês (séc. XIX – XX) e imperialismo americano (1920-1940).
  • 2º MOMENTO: diplomacia com os vizinhos americanos (todas as Américas, incluindo os EUA), que vai da Chancelaria de Rio Branco (1902-12) à presidência de Juscelino Kubitschek (1956-61), especificamente a Operação Pan-Americana, em 1958.  É marcado pela “aliança não-escrita com os Estados Unidos”, para uma projeção no sistema interamericano e, posteriormente, no sistema mundial. Inicialmente a aliança com os EUA servia como defesa contra os colonialismos europeus e como um importante apoio em um continente predominantemente hispânico.
  • 3º MOMENTO: iniciou-se com a OPA (1958), que foi uma tentativa de transformar o Brasil em um parceiro privilegiado dos EUA no sistema interamericano (possibilidade rechaçada pelos EUA, que não admitiam a superação do subdesenvolvimento brasileiro) e continua até hoje, marcada agora por não mais priorizar as relações com os americanos. Esse momento caracteriza-se pela busca de uma posição no sistema mundial e não apenas no próprio continente.

A Política Externa do Brasil Monárquico

  • As duas fases se situam no Primeiro Momento da periodização.
  1. 1830-1850: ainda submetido aos ingleses, através de tratados livre-cambistas; preocupava-se em sufocar as rebeliões internas e, por isso, não intervinha nas Repúblicas Platinas.
  2. 1850-1870: revogavam-se os tratados livre-cambistas, adotando-se o protecionismo; o Império enfrente a Inglaterra na Questão Christie e passa a intervir nas Repúblicas Platinas.

Política Interna e Política Externa


Resumo do cap. 12 do livro Por Uma História Política, de René Rémond – Política Externa Brasileira I – Prof. André Reis da Silva

  • duas correntes:
  1. a da história política propriamente dita (Aron, Merle): analisavam as escolhas de política interna e as que se supõem ligadas aos assuntos externos.
  2. a das relações internacionais contemporâneas (Renouvin, Duroselle): consideravam a política interna dos Estados como uma das principais explicações para o jogo internacional.
  • questões apresentadas ao historiador político sobre política externa e relações com os assuntos internos:
  1. a política externa constitui uma categoria distinta e autônoma?  – alguns teóricos fazem uma distinção entre “assuntos de dentro” e “assuntos de fora”, com primazia dos assuntos internos, por questão de soberania; – outros (como Aron) vão mais além e reforçam a dicotomia política externa x interna, de forma análoga à oposição social compatriota x estrangeiro; – alguns, ainda, recusam essa dicotomia, como Hoffmann, que aponta as semelhanças entre as duas políticas, Duroselle, que, ao mesmo tempo que recusa a oposição dentro x fora e reconhece que não há clivagens herméticas (que assuntos internos estão ligados aos externos e vice-versa, embora existam alguns atos “puros” de uma política ou outra). em suma, há uma primazia do interno, mesmo alguns teóricos considerando ou não a relação entre as duas esferas.
  2. prevalecendo o interno sobre o externo, a política externa é orientada em torno dele? – a) injunções de tempo longo: considera fatores como demografia, economia, ideologias internas, aspectos sociais, culturais e históricos do país (principalmente a questão de “identidade nacional”), os quais repercutem na abordagem externa (França e EUA são exemplos dessa orientação na política externa). A questão da identidade choca-se com os interesses de certas elites internas, quando estas pretendem invocar modelos externos de sucesso (ex.: Itália implantou o modelo alemão na reunificação, mas durante o período de Mussolini, voltou a ouvir as elites internas tradicionais, “aburguesando” o fascismo e entrando na II Guerra ).  Os países socialistas e do Terceiro Mundo, principalmente, foram acometidos por disputas internas sobre a adoção de modelo X ou Y (URSS, China, países islâmicos), em que a ideologia, utilizada pelos grupos dirigentes para perpetuar e reproduzir determinado modelo, torna-se um dos principais aspectos da relação entre o interno e o externo. Ainda, pode-se justificar a opção pela “primazia” da política externa como forma de se obter consenso entre opinião pública, elites divergentes etc e preservar a ordem social, favorecendo a unidade da nação (ex.: política externa de De Gaulle). – b) a influência da política interna sobre a externa é percebida em vários níveis no curto prazo: 1º nível) das grandes famílias políticas, que têm sua própria concepção de política externa e que contribuem para a elaboração das escolhas políticas internas; 2º nível) dos grupos de pressão parlamentares: geralmente não coincidem com os interesses dos governos, exceto quando o grupo dirigente (Executivo) possui autonomia suficiente para realizar seus projetos internacionais; 3º nível) do ambiente: significa que os condutores da política externa de um país analisam a conjuntura interna em suas tomadas de decisões.
  3. como as injunções externas e outros elementos das relações internacionais podem interferir na política interna? – primeiramente através da geopolítica, onde certos dados geográficos repercutem na ordem interna (posição bastante dogmática); – o estado do sistema internacional (conjuntura) pode alterar as opções de política interna, seja por uma tendência a determinada corrente, seja por um acontecimento recente que afeta a dinâmica doméstica.