A Formação dos Intelectuais

Ficha de resumo do texto do livro Os Intelectuais e a Organização da Cultura, de Antonio Gramsci – Política II: Teoria Política Contemporânea – Prof. Luis Gustavo Mello Grohmann

Como se formam as diversas categorias intelectuais?

  1. De dentro de cada grupo social (intelectuais orgânicos), que cria de forma orgânica uma ou mais camadas de intelectuais que lhe dão homogeneidade e consciência da sua própria função. Isso ocorre em diferentes campos: político, econômico, social etc. Um exemplo recente: parques tecnológicos (associação de empresas + universidades).
  2. De categorias de intelectuais preexistentes (intelectuais tradicionais), que, apesar de transformações históricas das formas sociais e políticas, resistem e continuam atuando no modo de produção atual. Exemplo: os eclesiásticos, que ligados à aristocracia fundiária, criaram uma camada de administradores, cientistas, teóricos, filósofos não-eclesiásticos, etc. Esses tipos consideram-se autônomos em relação à classe originária.

Quais são os limites máximos da acepção de intelectual? É possível encontrar uma maneira de diferenciar todas as variadas formas de atividades intelectuais e distingui-las dos outros grupos sociais?

  • a resposta deve ser investigada no conjunto geral de relações sociais e não no que é intrínseco às atividades intelectuais.
  • “Todos os homens são intelectuais […], mas nem todos os homens desempenham na sociedade a função de intelectuais.” (pag. 7)
  • A distinção entre intelectuais e não-intelectuais se refere à imediata função social da categoria profissional dos intelectuais.
  • Existem graus diferentes de atividade específica intelectual.
  • Não se pode falar em não-intelectuais, pois todo homem, fora de sua profissão, desenvolve alguma atividade intelectual: não há separabilidade. (Lembremo-nos: homens são animais racionais).
  • O novo intelectual age ativamente na vida prática como construtor, organizador, persuador permanente – e não apenas orador-, elevando-se a uma categoria de dirigente. Se ficasse apenas superior em alguma técnica-trabalho, seria apenas um especialista.
  • As categorias especializadas para exercer função intelectual se formam em conexão com todos os grupos sociais (principalmente os mais importantes), sofrendo elaborações amplas e complexas em ligação com o grupo dominante.
  • O que caracteriza um grupo social dominante é a assimilação e conquista ideológica dos intelectuais tradicionais.
  • O fator educacional é decisivo na formação dos intelectuais: quanto maior o número de escolas especializadas e mais alta for sua hierarquização, maior a complexidade cultural de uma sociedade, que se reflete, por sua vez, nas outras esferas – a industrial, por exemplo.
  • A preparação dos intelectuais vem da especialização técnico-cultural, a qual depende de uma base educacional sólida (em quantidade e qualidade das escolas em todos os níveis).
  • A formação de camadas intelectuais não é democrática, mas se origina de um processo histórico tradicional. Logo, a ampliação da base para a seleção de intelectuais numa estrutura democrática gera inconvenientes: desemprego, por exemplo.
  • A capacidade do sistema de absorver os intelectuais não é instantânea, como ocorre com os outros grupos sociais, mas é mediada por um conjunto de superestruturas:
  1. Sociedade civil (organismo privado) – hegemonia do grupo dominante sobre toda a sociedade.
  2. Sociedade política (Estado) – domínio direto (de comando) no Estado e sobre o governo jurídico.
  • Os intelectuais são instrumentos do grupo dominante para o exercício das funções subordinadas da hegemonia social e do governo político. Essa conexão se dá por um consenso histórico das massas com relação ao grupo dominante (consenso espontâneo) e pelo aparato de coerção estatal, que garante legalmente a disciplina dos grupos reacionários (não consensuais).
  • Essa função organizativa da hegemonia social e do domínio estatal dá lugar a uma certa divisão do trabalho, logo, a uma gradação de qualificações. Assim, há de se diferenciar a atividade intelectual em graus, inclusive do ponto de vista intrínseco.
  1. Intelectuais de alto grau: criadores de várias ciências, da filosofia, da arte, etc.
  2. Intelectuais de mais baixo grau: administradores e divulgadores mais modestos da riqueza intelectual já existente.
  • Outro aspecto do sistema social democrático-burguês com relação à categoria dos intelectuais diz respeito à concorrência, ao desemprego, à emigração, superprodução escolar, devido a uma formação em massa de intelectuais.
Posição diversa dos intelectuais de tipo urbano e de tipo rural
  • Intelectuais de tipo urbano: originam-se da indústria e estão vinculados a ela; não possuem iniciativa autônoma; articulam a massa instrumental com o empresário; são bastante padronizados; há um espírito de grupo nos baixos estratos; as massas instrumentais, através de seus intelectuais orgânicos, podem influenciar politicamente os técnicos industriais.
  • Intelectuais de tipo rural: são tradicionais, ligados à massa camponesa e pequeno-burguesa das cidades; aproximam a massa social rural com a administração estatal ou local (mediação político-social); há uma relação de admiração e desprezo dos camponeses para com os intelectuais: admiram, quando aspiram à ascensão social, mas fingem ao mesmo tempo desprezá-los.
O partido político moderno

O que é que o partido político se torna em relação ao problema dos intelectuais?

  1. Para alguns grupos sociais, o partido político é um modo particular de construir a categoria de intelectuais orgânicos destes grupos, diretamente no campo político e filosófico.
  2. Para todos os grupos sociais, o partido político é o mecanismo que representa na sociedade civil aquilo que o Estado representa na sociedade política, fundindo intelectuais orgânicos de um certo grupo com intelectuais tradicionais. Porém o partido desempenha sua função muito mais completa e organicamente que o Estado desempenha a sua em âmbito maior.
  • Todos os membros de um partido político são intelectuais.
  • Faz-se importante a função dentro do partido, que é diretiva e organizativa, logo, intelectual.
  • Os membros de um partido político superam elementos econômicos de seu desenvolvimento histórico para se tornarem agentes de atividades gerais.
Questão histórica da formação dos intelectuais tradicionais
  • Origens no mundo grego e na organização social do Império Romano.
  • O catolicismo e a organização eclesiástica preservaram, através do monopólio cultural, as atividades intelectuais, da queda de Roma até o século XVIII.
  • Itália: intelectuais de caráter internacional e cosmopolita – desagregados, remonta à queda do Império Romano.
  • França: após a Revolução ocorre um desenvolvimento harmônico dos intelectuais, movido pelo caráter nacional – integrados. Assim, vão expandir sua cultura e cosmopolitismo nos séculos seguintes.
  • Inglaterra: originados da base industrial moderna, os intelectuais orgânicos predominam, mas os tradicionais se conservam, através de uma evolução inédita da aristocracia fundiária em intelectuais tradicionais.
  • Alemanha: agrega características da formação inglesa e italiana. Dos ingleses herdaram a conversão dos Junkers (aristocracia rural) em intelectuais tradicionais, porém com influência política e militar muito maior do que a correspondente classe na Inglaterra. Dos italianos herdaram a fragmentação, graças ao Sacro Império, o que lhes conferia um caráter cosmopolita-universal, e não nacional.
  • Rússia: forças nacionais passivas, inertes, que sofrem influência de grupos externos e, ao mesmo tempo, assimilam as influências estrangeiras, adaptando-as. Os intelectuais russos possuem caráter nacional-popular, mesmo que o conhecimento tenha sido buscado fora do país e significa uma reação à inércia histórica vivida.
  • Estados Unidos: formação da elite intelectual por imigrantes anglo-saxões, que são por si próprios uma elite moral, cultura importada, mas que se desenvolve bem mais rápido que na Europa. Não há intelectuais tradicionais e isso permitiu o equilíbrio dos intelectuais e a formação maciça de todas as superestruturas modernas no país, com base em intelectuais orgânicos.  Ressalta-se ainda a influência de intelectuais negros.
  • América do Sul e América Central: não há uma ampla categoria de intelectuais tradicionais nem de intelectuais orgânicos. O clero e uma casta militar são categorias intelectuais tradicionais fossilizadas da herança ibérica. Como a base industrial é restrita, não desenvolveram superestruturas como os EUA. Há uma composição ainda muito subordinada a interesses clericais e militaristas.
  • Japão: formação do tipo inglês e alemão, ou seja, civilização de comportamento industrial desenvolvida dentro de uma estrutura feudal-burocrática, mas com características próprias.
  • China e Índia: há uma distância enorme entre os intelectuais e o povo, causada principalmente pelas religiões (escritura).

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