Geografia Política – Introdução

Questionário I  – Geografia Política – Prof. Aldomar Arnaldo Rückert

1. O que significa a afirmação abaixo?

“(…) é na relação entre a política – expressão e modo de controle dos conflitos sociais – e o território – base material e simbólica – que se define o campo da geografia política.” (CASTRO, 2005, p. 15-16).

Iná de Castro, em seu livro Geografia e Política, destaca como componentes essenciais do processo histórico de formação das sociedades a política e o território, sendo aquela uma ciência por si própria e de natureza um tanto quanto instável, na medida em que há uma relativa dificuldade em entender ou explicar um fato político na época em que se está vivendo-o, e; este um elemento fundamental do estudo da Geografia, utilizado para vincular uma sociedade a um espaço delimitado, que, por sua vez, será gerido graças à política estabelecida ali. Portanto, a associação dos dois conceitos: o de Política (como instrumento básico da administração estatal) e o de Território (como objeto geográfico de estudo principal e, também, elemento básico constitutivo de um Estado) são facilmente relacionados no escopo da disciplina de Geografia Política.

2. Dentre os doze grandes fenômenos que nas últimas décadas do século XX colocam o fato político em destaque na agenda da disciplina, citados por Inês de Castro (2005, p.16), escolha três significativos para você. Elabore uma síntese sobre cada um deles, procurando fundamentar suas observações, de preferência em outras fontes bibliográficas.

Destacam-se 3 dos fenômenos importantes e aparentemente contraditórios apontados por Iná de Castro, que situam a política no escopo da geografia: a globalização, um dos mais amplos e quiçá centrais dos fatores na medida em que desencadeia muitos outros; o enfraquecimento do Estado-nação, conseqüência imediata da herança neocolonial do final do século XIX até a Primeira Guerra e, mais atualmente, do neoliberalismo econômico, e, a expansão da democracia, tomada sob o ponto de vista de algumas correntes das ciências políticas como resultado da manutenção da balança-de-poder relativamente pacífica em esfera global. A globalização, através do estabelecimento de padrões arraigados e duradouros de interligação mundial, acelera os impactos dos fluxos e padrões inter-regionais de interação social de modo que a potência hegemônica (na esfera global) de certa forma determine, imponha, influencie todo o planeta. Como conseqüência disso, os Estados-nação não mais concentram todas as funções que desempenhavam há dois séculos atrás, haja vista o surgimento de novos atores internacionais (empresas transnacionais, organizações internacionais, a mídia, a internet e o próprio indivíduo como eleitor mediano dentro da multiplicidade de culturas e sistemas a que é exposto), os quais podem muito bem atuar de forma fragmentada, como cita Castro no exemplo das redes terroristas.

3. Por que a guerra de redes – um inimigo difuso – reforçaria a certeza do papel secundário dos Estados Nacionais? (CASTRO, 2005, p. 34) Você concorda ou discorda desta afirmação? Justifique.

Concordo. Como já salientado na questão anterior, Castro nos apresenta o terrorismo (em especial os ataques de 11 de setembro de 2001 ao World Trade Center) como exemplo da fragmentação do poder do Estado Nacional na atualidade, pois não há mais a necessidade de um território para a articulação de uma luta contra um Estado em específico (no caso, o terrorismo, em redes espalhadas pelo mundo, contra os Estados Unidos da América, seu principal inimigo). Isso é compreensível na medida em que estes novos atores internacionais que vieram se consolidando desde a Revolução Francesa aproximadamente, agem de forma descontínua em âmbito global. Os EUA atualmente não possuem um inimigo único, em se tratando de terrorismo (mesmo que o ex-presidente George W. Bush tenha elaborado a lista dos países considerados do “eixo do mal”), já que há focos de contestação não só ao desrespeito da hegemonia norte-americana para com os países árabes muçulmanos, mas também de oposição às guerras ainda de caráter imperialista que foram travadas na última década, as quais perpassam culturas e domínios considerados legítimos pelos povos que os possuem.

Um outro bom exemplo, seriam o que se pode denominar “poderes paralelos”, como as redes de narcotráfico, de prostituição, tráfico de órgãos e outras. Estas, já num plano considerado negativo (ilegal) para a maioria das nações atuais, da mesma forma, não estão fixadas a um território apenas, porém dispersas por todo o planeta, em diferentes países e regiões. Logo, constituem uma nova e fragmentária forma de domínio darkside nas relações internacionais contemporâneas.

4. O que significa o conceito de territorialidade política contido no parágrafo abaixo?

“O argumento aqui é que pensar em geografia política implica em perceber a impossibilidade de separar o que se encontra originalmente imbricado: a geografia universitária e os interesses das elites políticas nacionais. Este ponto de partida considera o fato de que a geografia tenha se institucionalizado na segunda metade do século XIX europeu, num momento de grandes disputas territoriais no continente e de consolidação, não apenas da ideia de nação, mas da sua territorialidade política como uma condição essencial da sua existência.”  (CASTRO, 1995, p.42)

Castro ressalta um dos principais problemas enfrentados pela Geografia Política para consolidar-se como disciplina após as duas grandes guerras mundiais do século XX, já que a sua origem deu-se pela teorização através de Ratzel, Mackinder, Mahan, Kjellén e outros do território como principal arma de expansão política de um Estado, o que acabou, na prática, sendo buscado principalmente pela Alemanha em duas ocasiões.  Isso gerou um certo preconceito para com a Geografia Política, pois ela passou a ser vista como a disciplina do nazismo, ou, a disciplina que levou o mundo às guerras pela busca de expansão territorial e é justamente neste contexto que territorialidade política se apresenta como um conceito relevante no escopo da geopolítica. A territorialidade política, designaria, portanto, segundo Castro, o papel da Geografia Política, situando-a numa posição importante da análise das sociedades em esfera macroanalítica, ou seja, as nações buscam mercados no plano global para melhor atender aos seus interesses de modo que, para isso, precisam de uma certa forma conquistar  (no sentido de relações comerciais e de diplomacia, onde entra a política) economicamente um outro território.

5. A centralidade territorial foi um dos marcos da modernidade. Quais são e como se caracterizam as principais etapas da formação e consolidação do Estado Territorial Moderno? Procure ressaltar os seguintes aspectos: a) as relações entre as guerras religiosas (Guerra dos 30 Anos) e a Paz de Vestfália; b) relação entre o Absolutismo, a gênese do Estado Territorial e a coesão interna; c) o sistema Westphaliano da ordem internacional e as conquistas territoriais; d) o sistema de guerras de conquista e a geração de importantes consequências na França e nas colônias inglesas na América; e) o crescimento do patriotismo e do nacionalismo; f) relações entre o triunfo do sistema territorialista e as guerras coloniais.  (ROSECRANCE, 1986).

O Estado Territorial Moderno, que emergiu no final da Idade Média como unidade organizacional européia pela aliança rei-burguesia contra a nobreza feudal, substituem algumas primazias antes vigentes, tais como a lealdade absoluta ao papa e à instituição da Igreja Católica e o Sacro Império Romano, por exemplo. Inicia-se neste período a tentativa de construção de um incipiente nacionalismo em torno da figura do rei ou príncipe (apontada por Maquiavel), a fim de concentrar a população em torno de um território unificado, o que só vai efetivar-se de fato no século XVIII. Mesmo assim, havia agora uma crescente oposição ao antigo universalismo medieval, marcada pela concepção político-territorial, o que exigia intensa coesão interna nos Estados-nação e o mínimo de organização em termos de exército e aparato mlilitar para empreender as guerras de expansão de domínios.

Desde o século XV, inspirados no sucesso da empresa espanhola de colonização nas Américas, os Estados monárquicos europeus passaram a priorizar o fator econômico para a consolidação e expansão dos seus territórios e, por isso, rivalizavam muitas vezes com suas cidades comerciais. As monarquias entendiam que um Estado forte era capaz de abastecer-se de sua própria produção (o que conferiria liberdade e independência ao reino em relação aos demais) e as cidades comerciais estavam cada vez mais interessadas no comércio internacional.

Com o advento da Reforma Protestante, pipocaram batalhas religiosas por todo o continente europeu, especialmente na atual Alemanha, França e Países Baixos.  Terminado este conjunto de guerras intestinas (conhecido como Guerra dos Trinta Anos), os Estados europeus assinaram a Paz de Vestfália, que significou a autonomia político-militar-religiosa de cada príncipe  de cada região, ou seja, findavam as disputas internas de soberania e prosperavam as disputas contra nações vizinhas. No século XVII, somente a França de Luís XIV conseguiu expandir-se territorialmente, porém a prosperidade do rei-sol findara em 1713, com o Tratado de Utrecht, na qual as demais monarquias interromperam o imperialismo francês. O que havia agora era um equilíbrio de forças e, portanto, uma considerável repulsa ao destaque de uma delas no cenário internacional da época.

No século XVIII, todavia, as monarquias passaram a adotar o comércio internacional como forma de expandirem-se (o que já era feito por algumas cidades como Gênova, Veneza, etc no século XV e XVI) e de ampliarem seus domínios pelo controle das zonas fornecedoras de matérias-primas, haja vista a necessidade destas para a produção industrial. Os ingleses, como maior potência naval do período, voltaram-se para a Índia após perderem as 13 colônias norte-americanas, enquanto as demais nações continentais  ainda disputavam colônias na América e costa da África. Isso já demonstrava um relativo enfraquecimento do poderio britânico em controlar um vasto império global, pois foi a necessidade de aumentarem as cobranças de impostos sobre as colônias americanas que levaram à revolução pela Independência dos Estados Unidos.

No mesmo contexto do século XVIII surgem as guerras napoleônicas, que vão despertar o nacionalismo em várias regiões da Europa, não só nas posteriores democracias liberais, como também os conservadores autocráticos uniram-se em torno de ideais nacionais. Daí em diante, os países vão cada vez mais realizar comércio internacional baseados em um certo patriotismo, cuja manifestação última deu-se no colonialismo da metade do século XIX, sobre África e Ásia principalmente.

6. Os princípios da centralidade territorial e do Estado Moderno foram fundamentados por Machiavel e Ratzel, dentre inúmeras teorias. Em quais aspectos os enunciados de Rosecrance coincidem com aqueles apontados pelos dois clássicos?

Friedrich Ratzel asseverava a imprescindibilidade do solo para um Estado forte, da mesma forma que Maquiavel afirmava que somente através da unificação territorial um princípe teria sucesso em sua empresa. Rosecrance, por sua vez, também salienta que as monarquias da Idade Moderna, na sua consolidação no século XVIII, perceberam a necessidade de um comércio pacífico (e internacional) para a expansão dos seus territórios e, a partir daí, um colonialismo cada vez mais acentuado. As etapas da expansão, propostas por Ratzel (em ligação direta com o solo, ou seja, não existiria Estado sem um território definido) e por Maquiavel (principalmente no que diz respeito à centralização político-territorial, típica do Absolutismo, além da defesa desta por um exército nacional) foram fundamentais, conforme revelou Rosecrance através de uma ampla análise histórica, para a evolução desde a Idade Média fragmentada até os primeiros passos do imperialismo do século XIX.

7. Ratzel afirma em seu artigo clássico “O Solo, a Sociedade e o Estado” (1898), dentre inúmeras passagens importantes, que um povo regride quando perde território. A tarefa do Estado é proteger o território contra os ataques externos que tendem a diminui-lo. O parágrafo abaixo representa estas afirmações.

“Essa mesma necessidade de defesa é também o resultado do mais notável desenvolvimento que apresenta a história das relações do Estado com o solo; quero me referir ao crescimento territorial do Estado. O comércio pacífico pode preparar esse crescimento, porque ele tende finalmente a fortalecer o Estado e a fazer recuar os Estados vizinhos.”  (RATZEL, p.96, 1983)

Por estar presente na constituição real do Estado nacional alemão, Ratzel dispunha de grande conteúdo histórico para analisar o processo de crescimento territorial. A própria Alemanha torna-se um exemplo para suas observações tendo em vista a sua unificação promovida por Otto von Bismarck, iniciando a ampliação de seu território através do Zollverein, uma união aduaneira e alfandegária dos Estados da Liga Alemã, em 1834. Essa política proporcionou à região um grande crescimento industrial e uma integração dos Estados antes fragmentados, primeiros passos para a Unificação Alemã, demonstrando a capacidade de fortalecimento não apenas econômico mas também da união interna criada através do comércio.  (resposta elaborada por Joana Oliveira de Oliveira – adaptada)